Páginas


"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


sábado, 16 de abril de 2022

Um rosto para a heroína – por José Luís Lira (*)

"Monstrengo" construído pela Prefeitura de Crato para simbolizar Dona Bárbara de Alencar. Um "aleijão" de uma "Bárbara de Alencar anã", na calçada da Coletoria Estadual, na Praça da Sé

   Numa conversa amena com o confrade Heitor Feitosa, do Instituto Cultural do Cariri, surgiu, por parte dele, a ideia de reconstruir facialmente a heroína Bárbara de Alencar. Penso que alguns leitores podem estar a indagar-se sobre quem é esta mulher. Nascida em 1760, dona Bárbara participou ativamente dos movimentos libertários naquele Brasil colonial. Seus filhos Senador Alencar, Tristão Gonçalves e Pe. Carlos, os dois últimos mortos durante a Confederação do Equador (1824), já no Brasil imperial. Historicamente, Bárbara de Alencar foi a primeira presa política do Brasil. Consta que ela esteve presa no Forte de Nossa Senhora da Assunção, em Fortaleza. Da capital do Ceará ela foi levada a Recife e Bahia, onde teria sido perdoada das acusações que levaram-na à prisão. De retorno ao Ceará, ela passa a residir em Crato e dali, em 1831, parte para Santana do Cariri e, posteriormente, a Fronteiras, no Piauí, onde ela veio a falecer e recebeu sepultura (1832).

    Em termos de literatura, Bárbara de Alencar é a avó do escritor José de Alencar e quinta avó de Rachel de Queiroz, como a própria escritora afirma em crônica. A reconstrução facial é uma técnica que possibilita, a partir de dados contidos no próprio crânio da pessoa, que cientificamente se faça uma aproximação do que foi a imagem da pessoa a quem pertenceu o crânio. Cícero Moraes, designer 3D, é expert na matéria. Com ele já trabalhei em outras reconstruções e lhe propus então fazer a de Dona Bárbara. Uma das figuras mais importantes do Ceará, avó do “pai” de Iracema, logo tão importante quanto.

     Conforme protocolos que cumprimos, vimos que há muitos anos os restos de Bárbara foram levados de sua sepultura primitiva à Capela de Itaguá, distrito de Campos Sales. Então, informamos ao presidente do ICC, Heitor Feitosa, da necessidade de autorização por parte do Bispo da Diocese, a considerar o tempo da sepultura. Fomos então à Cidade de Campos Sales, recebidos na Câmara Municipal e no Seminário Paroquial, onde mostramos as intenções pretendidas. Contudo, deixamos a visita a Itaguá para outra ocasião.

     O cuidado do Instituto Cultural do Cariri em querer fazer conhecida a face da heroína Bárbara de Alencar, é dos mais justos. Por quê? Porque naquela época não havia fotografia. Nem sequer uma pintura contemporânea existe. Daí nosso interesse e da Comunidade desta dita Terra Bárbara, quem sabe em homenagem a ela.

    A verificação visando reconhecer os restos mortais de Dona Bárbara não pode ser feita. Assim, a imagem da heroína ficará guardada no tempo e no espaço, esperando um momento para, quem sabe, ser revelada, se seu crânio apresentar condições. Além das razões apresentadas é, também, uma forma de reverenciar a querida e amada Rachel de Queiroz que uma vez visitou o Forte, em Fortaleza, onde a heroína teria ficado e disso fez crônica, como agora o fazemos com essa “expedição”. Ademais, aproveitarei para cumprir o restante da agenda no Cariri, onde visitarei os locais do Pe. Cícero, antes de retornar às atividades do dia-a-dia.

    E concluo com a expressão do tema de abertura dos vídeos da Coleção Os Cearenses, da TV O Povo, “Bárbara olha esse chão como é seco o sertão...” do Ceará tão amado!

 (*) José Luís Lira é advogado e professor do curso de Direito da Universidade Vale do Acaraú–UVA, de Sobral (CE). Doutor em Direito e Mestre em Direito Constitucional pela Universidade Nacional de Lomas de Zamora (Argentina) e Pós-Doutor em Direito pela Universidade de Messina (Itália). É Jornalista profissional. Historiador e memorialista com mais de vinte livros publicados. Pertence a diversas entidades científicas e culturais brasileiras.
 
    

3 comentários:

  1. Desde 1969 quando cheguei ao Crato e fixei residência nunca vi um evento politico ou histórico que os oradores não iniciassem os seus discursos fazendo uma eloquente saudação a Barbara de Alencar. Nos últimos tempos a heroína perdeu a importância, tanto é que um prefeito mandou construir um verdadeiro monstrengo em sua homenagem. O "boloto" de cimento e areia representa muito bem os últimos prefeitos do Crato. Falta de respeito com Dona Bárbara.

    ResponderExcluir
  2. Pois é. Tenho prá mim que o cratense atual sofre um pouco da falta de fibra. Se tivesse mantido a mentalidade de 1960 já teria amarrado uma corda na anãzinha e arrastado a aberraçãi com um carro...vôte!

    ResponderExcluir
  3. Unknowm - Eu tenho certeza que os descendentes da heroína, se vivos fossem, fariam exatamente de acordo com a sua razoada opinião. Pensamos exatamente igual.

    ResponderExcluir