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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


sexta-feira, 28 de junho de 2019

CARIRIENSIDADE


Cariri: Caldeirão Cultural do Ceará

 Banda cabaçal em Barbalha

     De há muito, a região do Cariri é considerada o Caldeirão Cultural do Ceará. Esse "caldeirão" é o somatório dos saberes e celebrações que formam o Patrimônio Imaterial da nossa região, com destaque para as manifestações religiosas do povo caririense. Parte desse acervo veio de milhares de romeiros que, atraídos pela herança espiritual do Padre Cícero, fizeram de Juazeiro do Norte o sacrário de seus costumes e tradições. Muitos deles se fixaram no Cariri, trazendo para cá suas tradições populares, as quais, se juntaram ao caldo cultural que aqui já existia desde o início de 1700, fruto da colonização portuguesa. 

      Este mês de junho que hoje finda, foi permeado das tradições católicas mais autênticas do Cariri. Começou com a festa de Santo Antônio, em Barbalha. Teve continuidade com as festas de São João e São Pedro. São as três festas joaninas. Na abertura da Festa de Santo Antônio, o centro histórico de Barbalha ficou cheio de grupos da tradição popular como as bandas cabaçais, os penitentes, os reisados e as lapinhas, dentre outros. No Cariri, essas festas são comemoradas desde a nossa povoação, no início do século XVIII, mas também sofreram adaptações e acréscimos por conta da imigração de contingentes populacionais oriundos da chamada Nação Romeira que se espalha pelo interior do Nordeste.

Festa do Pau da Bandeira, em Barbalha

O patrimônio cultural do Cariri na visão de Oswald Barroso

      Poucas pessoas definiram tão bem o patrimônio cultural do Cariri como Oswald Barroso. É dele o conceito a seguir transcrito:

      “Poucas regiões do Brasil têm, como o Cariri, uma natureza tão pródiga, uma história tão rica e uma cultura popular tão diversificada. Festas, folguedos, ritos, mitos, lendas, narrativas orais, artesanatos, mestres brincantes e de ofício, santuários e sítios sagrados, marcos históricos e conjuntos arquitetônicos, sítios naturais e redutos ecológicos, tradições culinárias, passeios e belas paisagens, feiras e mercados, enfim, um número infinito de possibilidades e atrações a serem exploradas. Junte-se a isto uma vida intelectual e acadêmica em pleno crescimento, com sólidas instituições públicas, universidades, artistas, escritores e um plantel de profissionais técnicos e liberais da melhor qualidade”. 

O que é “Patrimônio Cultural Imaterial”

Reisado no bairro do Horto, em Juazeiro

    Segundo a Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura– UNESCO, o “Patrimônio Cultural Imaterial”  de um povo é transmitido de geração em geração e é constituído de “práticas, representações, expressões, conhecimentos e técnicas – junto com os instrumentos, objetos, artefatos e lugares culturais a eles associados – que as comunidades, os grupos e, em alguns casos, os indivíduos reconhecem como parte integrante de seu patrimônio cultural.” 

      Os bens culturais de natureza imaterial estariam incluídos nas seguintes categorias: Saberes - conhecimentos e modos de fazer enraizados no cotidiano das comunidades; Formas de expressão - manifestações literárias, musicais, plásticas, cênicas e lúdicas; Celebrações - rituais e festas que marcam a vivência coletiva do trabalho, da religiosidade, do entretenimento e de outras práticas da vida social; Lugares - mercados, feiras, santuários, praças e demais espaços onde se concentram e se reproduzem práticas culturais coletivas.

História:  como surgiu a devoção a Nossa Senhora da Penha


   Não é só em Crato, Campos Sales e Maranguape (no Ceará) que Nossa Senhora da Penha tem grandes festas religiosas, já que é a padroeira dessas cidades. A origem dessa devoção, comemorada entre nós no dia 1º de setembro, surgiu quando Nossa Senhora apareceu a um agricultor chamado Simão Vela, no oeste da Espanha, numa serra chamada Penha de França., por volta de 1434. Da Espanha essa devoção passou para Portugal e desta nação veio para o Brasil, na época colonial. 

    Em outras localidades brasileiras, a festa de Nossa Senhora da Penha ocorre no dia 8 de setembro. É o caso de Vitória, capital do Estado do Espírito Santo, cuja comemoração é considerada, pela Igreja Católica, como a “terceira maior festa religiosa do Brasil”, ficando atrás somente da comemoração que homenageia a Padroeira do Brasil, em Aparecida (SP), e do Círio de Nazaré, em Belém, no Pará.

      Nossa Senhora da Penha é ainda a padroeira da cidade de São Paulo e Itapira (ambas em SP), Serra Talhada (PE) e Resende Costa (MG), dentre outras.

E como essa devoção veio para o Cariri

     A atual catedral de Crato remonta a uma humilde capelinha de taipa, coberta de palha, construída – por volta de 1740 – pelo capuchinho italiano, Frei Carlos Maria de Ferrara. Este frade foi o fundador do aldeamento da Missão do Miranda, núcleo inicial da atual cidade de Crato, criado para abrigar e prestar assistência religiosa às populações indígenas que viviam espalhadas ao norte da Chapada do Araripe.

       Em janeiro de 1745, conforme pesquisa feita pelo historiador Antônio Bezerra, foi colocada numa das paredes da então capelinha de Nossa Senhora da Penha uma pedra com histórica inscrição. Tratava-se do registro da consagração e dedicação do pequeno e humilde templo, início da atual catedral de Crato. A inscrição foi feita por frei Carlos Maria de Ferrara, e nela constava que a capelinha fora consagrada a Deus Uno e Trino e, de modo especial, a Nossa Senhora da Penha e a São Fidelis de Sigmaringa, este último oficializado – no governo episcopal de Dom Fernando Panico – como o Co-padroeiro de Crato. 

         Abaixo, o texto constante da inscrição rupestre, infelizmente desaparecida:
“Uni Deo et Trino
Deiparae Virgini
Vulgo – a Penha
S Fideli mission.º S.P.N. Fran, ci Capuccinor.m
Protomartyri de Propaganda Fide
Sacellum hoc
Zelo, humilitate labore
D. D.
Sup. Ejusdem Sancti.i Consocy F.F.
Kalendis January
Anno Salutis  MDCCXLV”.


A devoção a Nossa Senhora das Dores


   Podemos afirmar, com toda segurança, que a cidade de Juazeiro do Norte – hoje conhecida em todo o Brasil, graças à figura do Padre Cícero Romão Batista – teve seu início como fruto da devoção a Nossa Senhora das Dores. Pois, a exemplo da maioria das cidades brasileiras de antanho, Juazeiro do Norte também nasceu em torno de um templo católico. A escritora Amália Xavier de Oliveira assim descreveu os primórdios desta cidade, no seu livro “O Padre Cícero que eu conheci”:

     “Ordenara-se Sacerdote o Pe. Pedro Ribeiro de Carvalho, neto do Brigadeiro, porque filho de sua primogênita, Luiza Bezerra de Menezes, e de seu primeiro marido, o Sargento-mor Sebastião de Carvalho de Andrade, natural de Pernambuco. Para que o padre pudesse celebrar diariamente, sem lhe ser necessário ir a Crato, Barbalha ou Missão Velha, a família combinou com o novel sacerdote a ereção de uma capelinha, no ponto principal da Fazenda, perto da casa já existente”.

A imagem primitiva de Nossa Senhora das Dores adquirida pelo Brigadeiro

    A primeira imagem de Nossa Senhora das Dores, venerada na capelinha de Joaseiro, foi adquirida pelo Brigadeiro Leandro Bezerra Monteiro em Portugal. E foi venerada como padroeira da Fazenda Tabuleiro Grande e, posteriormente, pela povoação do “Joaseiro”, por cerca de 60 anos. 

    Zélia Pinheiro, escrevendo ¬ no opúsculo Sesquicentenário de Fé – sobre a inauguração, em 19 de agosto de 1884, da nova capela de “Joaseiro”, esta já construída pelo Padre Cícero, em substituição à primitiva, edificada pelo Brigadeiro, narra: “(…) Continuava como Padroeira Nossa Senhora das Dores e fora colocada no Altar a mesma imagem trazida de Portugal para a Capelinha da Fazenda Tabuleiro Grande. Era uma imagem em estilo bizantino, de madeira, muito bem esculpida, tendo setenta e cinco centímetros de tamanho e permaneceu no Altar-Mor até setembro de 1887, quando foi trocada pela imagem que até hoje está lá”.

4 comentários:

  1. Cada dia sua "Caririensidade" se torna maior. Pelos tópicos desenvolvidos e disseminados. Hoje vou comentar a parte que trata das "Bandas Cabaçais" da região nordestina.

    Vê um governo financiando a boa vida dos Caetanos, dos Chico Buarque, dos Gilberto Gil e desprezando essas classes culturais a que você faz referência causa revolta. Só um governo vagabundo e populista, feito nas pernas da popularidade alheia é capaz de fazer.

    Parabéns, sua postagem está perfeita, muito rica de conhecimentos, de cultura, a mais completa pagina literária que o leitor tem o privilégio de conhecer.

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  2. Mutatis mutandis, é o mesmo que ocorre todos os anos na parte artística da ExpoCrato.
    Contratam a peso de ouro essas nulidades que são o “ópio do povo”: Wesley Safadão, Anita, Pablo Vitar, Jojô Todynho, duplas sertanejas cujas números musicais só mudar a mediocridade das letras, pois a música é a mesma porcaria (Rick e Renner; Gian e Giovanni; Jads e Jadson, et caterva) e não tem palco para os artistas da terra...

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  3. Vivemos uma inversão de valores como nunca antes na histórica dessa “Ré-Pública”!Elegem-se para a Presidência da Ré-Pública sindicalistas que antes nunca tinha administrado uma carrocinha de vender pipoca...este elege uma ex-guerrilheira para o mais alto cargo da nação que nunca foi sequer eleita vereadora...E chega-se ao cúmulo da mídia e Supremo Tribunal tentar soltar uma presidiário condenado em todas as instâncias e prender um juiz honesto que mandou o meliante para a cadeia.

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  4. Atravessamos tempos sombrios onde nunca foi tão atual o escrito de Rui Barbosa:
    "De tanto ver triunfar as nulidades, de tanto ver prosperar a desonra, de tanto ver crescer a injustiça, de tanto ver agigantarem-se os poderes nas mãos dos maus, o homem chega a desanimar da virtude, a rir-se da honra, a ter vergonha de ser honesto... Essa foi a obra da república nos últimos anos. No outro regime (a Monarquia) o homem que tinha certa nódoa em sua vida era um homem perdido para sempre. As carreiras políticas lhe estavam fechadas. Havia uma sentinela vigilante, de cuja severidade todos temiam a que, acesa no alto, guardava a redondeza como um farol que não se apaga... Em proveito da honra... da justiça... E da moralidade gerais."

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