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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


sexta-feira, 5 de julho de 2019

CARIRIENSIDADE


A depredação e destruição de monumentos públicos na conurbação Crajubar

     Na Região Metropolitana do Cariri muitos monumentos públicos já foram depredados e, alguns,  até destruídos. Ora, a depredação do patrimônio público é delito passível de detenção e multa. Para incorrer nesse crime basta "pichar monumentos públicos", notadamente aqueles com valor histórico, o que eleva a pena por se transformar em “crime ambiental”.

     Nunca devemos esquecer que “Patrimônio Público” é o conjunto de bens e direitos de valor econômico, artístico, estético, histórico ou turístico, e o fato destes bens pertencerem a um ente público – a União, um Estado, um Município, uma autarquia ou uma empresa pública – ou seja serem propriedades do povo.

Nessa destruição nem Barbalha escapou


     A imagem acima é do busto do presidente norte-americano John Kennedy que ornamentava um logradouro público em Barbalha. Kennedy foi assassinado em 1962 e o busto dele foi colocado numa praça de Barbalha cinco anos após sua morte. O monumento – feito de bronze – pela escultora brasileira Maria Rothier Duarte, foi doado pelo Lions Club de Barbalha à Prefeitura daquela cidade.

    O jornal “A Ação”, àquela época publicado semanalmente pela Diocese de Crato, no número de 25 de junho de 1967 noticiou: “A homenagem de Barbalha ao estadista falecido é das mais louváveis! É um reconhecimento aos benefícios recebidos pelo município, do governo norte-americano, através do Projeto Morris Asimow, responsável pela implantação, em Barbalha, das indústrias CECASA e IBACIP que geraram, anos seguidos, impostos, emprego e renda”.

Um registro do tempo em que Barbalha era tida como uma cidade aristocrática

      Em 1969, foi promulgada, pelo Prefeito de Barbalha, a lei abaixo, oriunda da Câmara Municipal daquela cidade:

“Lei n° 577
    Denomina Praça “Presidente John Fitzgerald KENNEDY”, a Praça pública localizada entre as ruas Divino Salvador, Major Sampaio e ao lado da Igreja do Rosário, nesta cidade, como abaixo se declara:

     A Câmara Municipal de Barbalha aprovou e eu Prefeito sanciono a seguinte Lei:

Art. 1° - Fica denominada “Praça Presidente John Fitzgerald KENNEDY”, a praça pública localizada entre as ruas Divino Salvador, Major Sampaio e ao lado da Igreja do Rosário, em final de construção, nesta cidade.

Art. 2° - Revogam-se as disposições em contrário, entrando esta Lei em vigor na data de sua publicidade.
Paço da Prefeitura Municipal de Barbalha (CE), 11 de agosto de 1969.
Antônio Costa Sampaio
Prefeito Municipal”

Nesta imagem, feita em 1956, membros da família Sampaio: Antônio Gondim, no primeiro plano, e Plínio Salgado (político e intelectual que marcou a história do Brasil, na década 30 do século passado). No segundo plano, da esquerda para direita, o Dr. Pio Sampaio e Antônio Costa Sampaio, este último ex-Prefeito de Barbalha

As voltas que o mundo dá: o cenário de Barbalha nos dias atuais

      Em Barbalha, antes de ter sido retirado do seu pedestal, o busto de bronze do Presidente Kennedy já era alvo da depredação dos vândalos que hoje assolam, como uma praga do Egito, a Terra dos Verdes Canaviais...Triste!

      Na última administração do prefeito José Leite (2013–2016, reeleito pelo PT), o busto de bronze do Presidente Kennedy (obra pública, propriedade do povo barbalhense) foi retirado da Praça com a mesma denominação, localizada ao lado da Igreja do Rosário. Esse busto só não desapareceu porque o Prof. Giuseppe Sampaio, diretor do Colégio Santo Antônio, quando o viu num caminhão, sendo levado para um depósito provavelmente da Prefeitura, pediu para abrigar a histórica obra de arte nas dependências do Colégio que dirige. Lá o busto está, na sala da diretoria a lembrar os tempos áureos da Terra de Santo Antônio.

      Já as indústrias CECASA e IBACIP tiveram suas atividades encerradas. Tem mais: no lugar do monumento de John Kennedy, o ex-prefeito José Leite mandou colocar outro busto. Este último, do ex-prefeito de Juazeiro do Norte, Mauro Sampaio, era um monumento de mau gosto moldado em cimento.

       Dias depois esse último busto foi destruído na calada da noite. Outro vandalismo! Consta que até hoje não foi consertado...  A Praça Presidente Kennedy (a designação oficial permanece, pois não foi revogada) está localizada em frente à Faculdade de Medicina de Barbalha (Campus da Universidade Federal do Cariri), e ao lado da Igreja de Nossa Senhora do Rosário e da Escola de Ensino Fundamental Senador Martiniano de Alencar. Um local diariamente bastante visitado por centenas de pessoas.


História: O “olhar estrangeiro” sobre o Cariri no século 19

    Em 2014, os professores Ivan da Silva Queiroz e Maria Soares da Cunha, do Departamento de Geociências da Universidade Regional do Cariri–URCA, publicaram interessante artigo – na Revista de Geografia da UFPE, volume 31, nº 3 –  com o título “Condicionantes socioambientais e culturais da formação do Crajubar, aglomerado urbano-regional do Cariri cearense”. Desse interessante artigo reproduzimos abaixo algumas informações que vão interessar aos leitores desta coluna. A conferir

     “João da Silva Feijó, George Gardner e Francisco Freire Alemão representam o que nós podemos qualificar como sendo o olhar “estrangeiro” sobre o pedaço de sertão nordestino chamado de Cariri no século XIX. Os três estudiosos passaram pelo Cariri-Araripe e deixaram importantes registros sobre esse território. João da Silva Feijó (1760 -1824) escreveu suas memórias entre 1800 a 1814, publicadas respectivamente em 1889, 1912 e 1914 pela Revista do Instituto Histórico Geográfico e Antropológico do Ceará - RIHGAC ou Revista do Instituto do Ceará – RIC”.

Expedição de Feijó

Livro sobre a expedição de Feijó
 
“João da Silva Feijó chegou ao Brasil em 1799 para cumprir o ofício de naturalista e realizar investigações filosóficas na Capitania do Ceará. Cumprindo a patente de sargento-mór das Milícias, durante sua permanência no Ceará (1799-1816), Feijó descreveu, mapeou, fez coletas de objetos ligados a História Natural, campo que o ligava a outros naturalistas da Europa. No segundo semestre de 1800, Feijó se dirigiu ao sul da capitania do Ceará, com destino as antigas lavras de ouro da Mangabeira. Por causa da seca se deslocou para a então vila do Crato, permanecendo cinco dias em terras da Serra dos Cariris Novos”.

 A epopeia de George Gardner


Livro sobre as viagens de Gardner pelo Brasil Império

     “O segundo intelectual é George Gardner (1812 - 1849), que se instalou em Crato em setembro de 1838. O escocês chegou ao Brasil em 1836 e a partir de 1837 percorreu as províncias do “norte” do extenso território brasileiro. No sul do Ceará, o estudioso chegou jovem, com 26 anos de idade, residindo durante cinco meses na cidade de Crato. Nesse período se voltou para estudos geológicos e botânicos, principalmente. A maior parte de suas anotações e as notícias de suas descobertas foram feitas no ano de 1839. Os escritos originais de Gardner foram encerrados em 1846”. Publicou seu livro, “Viagem ao interior do Brasil”, onde reúne as informações sobre as viagens nas terras do Ceará. Constam neles muitas informações e impressões das numerosas excursões realizadas nas redondezas das vilas de Crato e Barra do Jardim” (Hoje cidade de Jardim).

A Comissão Cientifica de Exploração


    “Já Freire Alemão é um prestigiado cientista do Brasil Imperial, e um dos mais importantes estudiosos da botânica. O “Diário de viagem de Francisco Freire Alemão” (volumes 1 e 2) congrega comentários, narrativas e impressões desse intelectual na ocasião em que se deslocou e permaneceu três meses na cidade do Crato em uma importante expedição científica que escolheu o Ceará como ponto de partida. O documento foi redigido entre março de 1859 e concluído em julho de 1861” (...) 

“Francisco Freire Alemão (1797-1874), se instalou no Crato em 1859 para realização de estudos em seu papel de presidente da Comissão Científica de Exploração. A povoação de Crato, criada como freguesia em 1762, elevada à vila em 21 de junho de 1764 e transformada em cidade em 1853, constitui o ponto no qual Freire Alemão se instalou entre dezembro de 1859 e março de 1860. Nesse período de sua estadia conviveu com inúmeros sujeitos da história intelectual, econômica e política do Ceará e do Cariri”.

O Crajubar dos dias atuais

    “O aglomerado urbano que se formou no extremo sul do território cearense, hoje conhecido nacionalmente como Crajubar, começou a ganhar expressão regional na década de 1960. Este arranjo urbano-regional, conforme sugere o vocábulo que o identifica, é fruto de um histórico processo de integração territorial das vizinhas cidades de Crato, Juazeiro do Norte e Barbalha. Portanto, é a justaposição das sílabas iniciais das referidas cidades na mesma sequência acima indicada que define o aglomerado em questão” (...)  “Do “oásis” natural descrito pelos três viajantes que atravessaram o Cariri no século XIX, formou-se, atualmente, o que chamamos de “oásis urbano” em meio aos sertões centrais do Nordeste, derivado da concentração e diversificação de atividades e fluxos nos três polos regionais. Este, em grande parte, fruto da centralidade regional do Crajubar, conquistada anteriormente, mas, ampliada e consolidada a partir da emergência do fenômeno Padre Cícero Romão Batista”.

      (As notas acima foram retiradas do artigo “Condicionantes socioambientais e culturais da formação do Crajubar, aglomerado urbano-regional do Cariri cearense”, de autoria dos professores Ivan da Silva Queiroz e Maria Soares da Cunha).

 Crato no final do século XIX e inicio do século XX

Um comentário:

  1. Como sempre digo um completo jornal. Aqui nesta postagem encontramos tudo aquilo que qualquer pesquisador sobre qualquer assunto e segmento precisa encontrar. Parabéns.

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