Ex-presidente depende mais da presidente do que ela dele
Nem sempre o ano novo começa em 1º de janeiro. O ano político de 2015 começou, de fato, ontem, com a entrevista da senadora Martha Suplicy à jornalista Eliane Cantanhede, de O Estado de S. Paulo.
É necessário digeri-la bem para acompanhar a luta surda entre a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Lula pelo controle não só do PT como dos seus principais aliados com vistas à eleição de 2018.
Lula quis suceder Dilma a partir deste ano. Dilma não deixou, e se reelegeu. Uma parte do PT, possivelmente a maior, quer Lula candidato à vaga de Dilma na eleição presidencial de 2018. Dependerá outra vez de Dilma.
Na montagem do seu novo governo, ela deu um chega para lá em nomes indicados por Lula ou a ele ligados. Por ora, Aloizio Mercadante, chefe da Casa Civil da presidência da República, parece contar com a preferência de Dilma para sucedê-la.
Lula a tudo observa sem adiantar suas pretensões.
Lula precisa mais de Dilma do que ela, no momento, precisa dele. Precisa que ela seja bem-sucedida. Se não for, a conta do seu fracasso lhe será debitada. E com razão.
Não foi Lula que inventou a história de Dilma, “a excepcional gestora?” Uma gestora até melhor do que ele? Não foi Lula que pregou: “Votem na mulher”? E não foi a ideia da “mulher de Lula” que atraiu os milhões de votos que em 2010 elegeram Dilma e derrotaram José Serra, do PSDB?
E então? Não bastará que ela governe bem. É preciso também que o apoie.
Agamenon Magalhães, governador de Pernambuco nos anos 50 do século passado, dizia que “ninguém governa governador”. Ninguém preside presidente. A não ser que ele seja um “banana”.
Dilma pode ser tudo, mas uma banana não é. Foi capaz de se impor a Lula e barrar seus passos no caminho de volta à presidência. Resistiu à pressão de Lula para que mudasse sua equipe econômica no segundo semestre de 2013.
Se tivesse cedido, Lula poderia tê-la atropelado, saindo candidato. Mudou a equipe agora. E escalou quem quis.
Dilma só precisará de Lula se por acaso for mal e enfrentar problemas com as ruas. “Lula está fora, totalmente fora”, comentou Martha. Mas ele ainda é o dono da chave dos movimentos sociais, todos dependentes dos favores do governo.
E é Lula, Dilma não, quem melhor transita entre os partidos que sustentam o governo dentro do Congresso. A insatisfação deles com a repartição de poder feita por Dilma só perde para a do PT lulista.
Se Dilma fracassar, Lula fracassará com ela pela absoluta impossibilidade de se desmarcar de sua criatura. Quem está, portanto, numa sinuca de bico é Lula e não Dilma.
O sucesso dela não será obrigatoriamente o sucesso dele. Mas o fracasso será, sim.
Enquanto isso, Mercadante espreita tudo de perto. E dá-se ao luxo de dizer que seu candidato à vaga de Dilma é Lula. Martha desmente que seja.
Lula acha que Mercadante sequestrou o governo. Martha detesta Mercadante, despreza Dilma e está magoada com o PT.
“Mercadante é inimigo. Rui Falcão, presidente do PT, traiu o partido. E o partido se acovardou ao recusar o debate sobre quem era o melhor [candidato] para o país, mesmo sabendo das limitações de Dilma”, espicaça Martha. “Já no primeiro dia [do segundo governo Dilma] vimos um ministério cujo critério foi a exclusão de todos que eram próximos de Lula”.
A senadora sente-se marginalizada dentro de um partido “cada vez mais isolado e que luta apenas pela manutenção do poder”. Pensa em deixá-lo. Talvez em breve.
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