O problema do governo tem nome e sobrenome. Nas últimas horas, políticos e jornalistas o chamam de Eliseu Padilha. Se estivessem certos, a solução seria simples. Bastariam uma esferográfica para a assinatura do presidente e uma folha para o ato de exoneração do chefe da Casa Civil. Mas estão todos enganados.
Chama-se Michel Temer o problema do governo. Ele chegou ao Planalto como solução constitucional para a autocombustão que consumiu o mandato de Dilma Rousseff. Virou um problema ao cercar-se de amigos tóxicos e subordinar sua administração à vulgaridade. Temer se absteve de perceber que o jogo político no Brasil mudou de fase.
Nesta sexta-feira, o presidente mandou sua assessoria divulgar uma nota. Nela, admitiu novamente ter pedido dinheiro à Odebrecht em 2014. Mas reiterou que “não autorizou, nem solicitou que nada fosse feito sem amparo nas regras da Lei Eleitoral.” Contabilizou o repasse da construtora ao PMDB em R$ 11,3 milhões. “Tudo declarado na prestação de contas ao Tribunal Superior Eleitoral”, enfatizou a nota. “É essa a única e exclusiva participação do presidente no episódio.”
O “episódio” que o texto do Planalto preferiu não esmiuçar envolve a Odebrecht, uma dezena de milhões reais e os dois maiores amigos do presidente da República: o ex-assessor da Presidência José Yunes e o chefe da Casa Civil Eliseu Padilha. O fato comporta pelo menos quatro versões: a de Temer, a de Yunes, a de Padilha e a versão verdadeira.
Nesse contexto, a manifestação divulgada pela assessoria presidencial apenas empurrou Temer para dentro de um Brasil alternativo. Um país fictício em que nada de reprovável aconteceu. Para que a nota oficial ficasse em pé, todos os brasileiros adultos teriam de aceitar a tese segundo a qual Temer não tem nada a explicar e que a crise que acaba de cair no seu colo está encerrada.
Nesta ficção que nenhum novelista assinaria para não passar por improvável, os brasileiros teriam de se fingir de bobos e ignorar o seguinte roteiro: o amigão Yunes recebeu em seu escritório envelope das mãos do doleiro Lúcio Funaro, um portador que o amissíssimo Padilha jura que nem conhece. No envelope que Yunes assegura ter recebido a pedido de Padilha, podia haver qualquer coisa, menos os milhões em verbas sujas que Temer renega, mas que os delatores da Odebrecht sustentam ter providenciado a seu pedido.
São tantas as confusões em que se mete o governo de Michel Temer que as coisas vão assumindo proporções inaceitáveis. Embaraços vão se transformando em hábitos. Descalabros vão virando parâmetro. De repente, nada precisa ser muito explicado. Dá-se de barato que os brasileiros se fingirão de mortos pelo bem da República.
Em nome da continuidade das reformas, ninguém perguntará: Onde Temer está com a cabeça que ainda não rompeu com Yunes, o amigo da onça? Pela estabilidade do condomínio partidário que dá suporte congressual ao governo, ninguém questionará: Afinal, Temer ainda não demitiu Padilha por que não quer ou por que não pode?
Costuma-se dizer que o brasileiro não tem memória. Michel Temer parece acreditar que os patrícios não têm mesmo é muita curiosidade.
Chama-se Michel Temer o problema do governo. Ele chegou ao Planalto como solução constitucional para a autocombustão que consumiu o mandato de Dilma Rousseff. Virou um problema ao cercar-se de amigos tóxicos e subordinar sua administração à vulgaridade. Temer se absteve de perceber que o jogo político no Brasil mudou de fase.
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