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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


sábado, 21 de agosto de 2010

Esperando o trem passar – Adaptado por Carlos Eduardo Esmeraldo

Será que alguém ainda se lembra do jornal “Tribuna do Ceará”? Pois é, há muitos anos existia por aqui um jornal com esse nome. Naquele tempo eu li nas páginas da “Tribuna” uma historinha que lembro até hoje. Vou tentar reproduzi-la ao meu modo.

Zito e Lídia casaram-se e foram morar numa casinha que haviam construído para eles, bem próxima à linha do trem, num bairro da entrada da cidade. A casa estava toda mobiliada, mas havia um problema. Toda vez que o trem passava, a porta do guarda-roupa se abria. Mesmo quando presa por uma folha de papelão dobrada ou travada pela fechadura, não tinha jeito, era só o trem passar que ela ficava aberta. Parecia que aquele móvel possuía um sismógrafo que detectava os mínimos tremores da terra sob o impacto do peso do trem. Claro que os dois pombinhos ficaram muito chateados por causa desse defeito.

Numa certa manhã, Lídia perguntou se a vizinha conhecia algum marceneiro que pudesse consertar a porta de seu guarda-roupa. Ela lhe indicou Moésio, um verdadeiro artista em tudo que fosse madeira. Mas fez uma ressalva: “Tome muito cuidado com ele. É o maior “Don Juan” desse bairro. Quando se embeleza de uma mulher, não há quem resistia aos seus encantos.” Lídia preferiu contar ao marido a existência desse marceneiro e pediu que ele fosse procurá-lo. Zito obteve informações sobre o marceneiro Moésio com um colega de trabalho, que lhe disse onde encontrá-lo e passou para ele toda fama da qual o moveleiro era possuidor. “Cuidado com sua mulher. Marque para ele ir consertar seu guarda-roupa numa hora em que você estiver em casa.” Zito assim procedeu. Marcou para o meio dia, quando ele estaria em casa para o almoço.

Aconteceu que o Moésio tinha uns serviços nas proximidades da casa do Zito e tão logo concluiu seu trabalho, aproveitou que estava perto da casa do seu novo cliente e por lá chegou um pouco antes do meio dia. Ao bater à porta, foi atendido por Lídia, uma morena muito bonita. Mas manteve-se sério, pois sua fama de mulherengo já estava complicando sua vida. Entrou na casa e a mulher lhe mostrou o móvel. Ele olhou, examinou cada detalhe e afirmou. “Minha senhora, o defeito é interno. Preciso ficar dentro do guarda-roupa para quando o trem passar eu descobrir onde está a falha que faz a porta abrir.” E assim foi feito.

Pouco depois das doze horas, Zito chegou apressado, pedindo que a mulher lhe servisse logo o almoço, pois ele iria verificar de perto o serviço que teria de ser feito no guarda-roupa. Passou direto para o quarto para trocar de camisa. Ao abrir o guarda-roupa, surpreso, viu Moésio abaixado lá dentro. E cheio de desconfiança perguntou: “Que diabos é que você está fazendo ai dentro?” E o pobre carpinteiro respondeu: “Se eu lhe disser que estou esperando o trem passar, o senhor não vai mesmo acreditar... não é?...”

Adaptação de Carlos Eduardo Esmeraldo
História original narrada por Chico Anísio, no jornal “Tribuna do Ceará” 1976/77(?)

3 comentários:

  1. Prezado Carlos Eduardo.

    Dizem que a maior festa com a chegada do trem na região sul do estado foi promovida por Dona Fideralina em Lavras da Mangabeira.

    Porem a historia registra que ao chegar em Juazeiro do Norte, um romeiro correu em direção a maquina do trem dizendo lá vem que meu padim mandou, abraçando-se a mesma e morrendo queimado e atropelado.

    Já em Crato, quando o trem se aproximou um caboclo da Rajalegre, quando viu a zoada gritou: lá vem a besta fera! Correu olhando pra traz, caiu num cacimbão que havia na praça e morreu afogado.

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  2. Caro Morais

    Minha mãe contava que no Crato, quando chegou o primeiro trem, um senhor correu para junto do trem dizendo: "Obra da natureza feita pela mão do homem" e colocou a mão em cima da caldeira da Maria Fumaça, soltando o maior grito. Ela tinha 24 anos na época, e assistiu a chegada do primeiro trem. Contava também essa história que você contou. E outra do 1° avião que pousou no Crato, um senhor, parece-me que o mesmo do trem correu para cima do avião e foi degolado pela hélice. Você sabe dessa história? Ela me dizia quem era o cidadão, mas a gente quando é jovem não se liga muito. Você sabe quem foi?
    Um grande abraço

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  3. Prezado Carlos.

    Já ouvir contar. Dizem que foi seu Joquinha. Quando o avião se aproximou ele saiu andando olhando pru ar e caiu num buraco quebrando um braço. Quando lhe perguntavam o que foi isso? Ele respondedia: quebrei um braço num acidente de avião.

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