DA IBIAPABA
Por Zé Nilton*
Sabe chilito, aquela coisinha feito binga de cabrito, amarelinha, que faz a festa da criançada pobre do Nordeste? Pouco se encontra à venda em Viçosa do Ceará. Estamos na terra da peta, uma iguaria feita de polvilho, um filhós pequeno, crocante, muito gostoso e que só faz bem. Nas ruazinhas das partes altas da velha cidade, uma casa e outra não, do lado direito da rua, e em todas as casas da esquerda, o fabrico doméstico de peta não chega pra quem quer. Viçosa do Ceará é pródiga em peta, pródiga em cachaça e igualmente pródiga em história.
Olha só: a maior concentração de índios da capitania de Pernambuco resultou no maior aldeamento indígena do Nordeste, aqui na Serra da Ibiapaba. Todos os olhares da catequese por via lusitana acorreu para a Serra Grande a partir da segunda metade do século XVII . Em 1700 se instala seu primeiro Aldeamento e Missão dos Índios Tabajara, em Viçosa da Ibiapaba.
Destas terras altas se narram episódios e figuras marcantes da trajetória da colonização portuguesa no Ceará e no Nordeste. Desde a saga do primeiro emissário jesuíta enviado de Pernambuco para aplacar a ira da indiada na Ibiapaba, logo após a beligerante passagem de Pero Coelho, e que resolvendo seguir até o Maranhão, o padre Francisco Pinto, terminou por ser trucidado pelos índios da nação Trarairiús, salvando-se seu coadjutor, o padre Luiz Filgueira.
Padre Pinto tornou-se o santo de todas as tribos do médio e baixo Jaguaribe e zona norte do Siará Grande. Tem também a passagem do intelectual, exímio orador e temido pelas cortes da época, o padre Antonio Vieira. Sem falar do imponente índio tabajara, na defesa documental de Tristão de Alencar Araripe(1), o assim batizado Antonio Felipe Camarão, aliás, Dom Antonio Felpe Camarão, título inédito dispensado a um índio,outorgado pelo Rei Felipe IV, por sua luta contra os holandeses desde o Ceará até Pernambuco.
A Ibiapaba é lembrada igualmente como paisagem e lugar de contendas portuguesas, indígenas e francesas na famosa obra do capuchinho Claude D´Abbeville, escrita em França no ano de 1614, logo após sua brava permanência de quatro meses em terras maranhenses.
Viera junto a uma companhia francesa a mando do rei Luiz XIII cujo fito era instalar a França Equinocial após a malograda tentativa da França Antártica, no Rio de Janeiro. E como missão católica, tirar os povos indígenas dos confins do inferno e trazê-los à purificação cristã.
Sua descrição sobre a passagem pela enseada de Camucim, olhando a Serra Grande, bem distante, é de uma sutileza própria da escrita dos viajantes europeus.
Sem dúvida uma leitura pra lá de prazerosa sobre uma faceta político-religiosa-militar empreendida por uma França ávida em implantar colônias no novo mundo.
Eurocentrismo, etnocentrismo, visão de mundo e forte inclinação apologética à parte, Claude d´Abbeville narra em detalhes a bravura da empresa francesa e todas as conquistas e todas as ações positivas e negativas em favor da salvação das almas selváticas e do domínio francês no Maranhão e terras circunvizinhas. Narra a história, a geografia, a cosmologia, a cosmogonia e a antropologia da grande nação Tupinambá, habitante do litoral brasileiro e sua concentração na Ilha do Maranhão.
Dei-me a mim um presente nos meus completos e bem vividos sessenta anos, a ansiada leitura da “ História da Missão dos Padres Capuchinhos na Ilha do Maranhão e terras circunvizinhas”, do padre d´Abbeville, reprodução fac-similar da edição publicada pela Livraria Martins Editora, em 1945; tradução de Sérgio Milliet.
Dela e de outras obras como a de Jean de Lery, de Frei Martinho de Nantes, de Ives d`Evreux, de Vicencio Mamiani, de André de Thevet e de tantos viajantes e missionários que descreveram seus encontros com o outro, os índios do Brasil, sejam do litoral sejam dos sertões, tenho a lamentar a falta desses escritos sobre os nossos Cariri da parte do Ceará.
É imergir num quebra cabeça a tarefa de historicizar de seu ponto de vista a saga guerreira e duas vezes vencidas a passagem desses povos pelos solos que pisamos.
Só para dizer, nunca me convenceu a infame característica Cariri difundida pelo seu mais ferrenho oponente o Tupi, e alimentada e reproduzida por quase todos os escritores indigenistas como “calados, desconfiados e macambúzios”. Um povo que sustentou uma luta inglória por tanto tempo, como ser isto? Bom, mas aí é outra história.
Escrevo estas linhas da capital da Ibiapaba, Tianguá, terra de caboclos trabalhadores, a perfeita mistura dos Tabajara com europeus.
(*) Antropólogo. Professor do Departamento de Ciências Sociais da URCA. jn-figueiredo@hotmail.com
(1) História da Província do Ceará, dos tempos primitivos até 1850. Fortaleza: Edições Demócrito Rocha, 2002.
Porf. Zenilton.
ResponderExcluirQue aula de conhecimentos esta sua. Parabens.
Abraços.
ficarei um tempinho ausente do blog, para me recuperar desse choque que foi o término desse meu namoro, mas de vez em quando postarei alguma coisa, pois sei que conquistei uma legião de fãs que amam meu trabalho, agradeço a todos os leitores, que me prestigiam e amam o que eu faço Deus abençoe todos vocês e peço que vocês orem (rezem) por mim para que Deus me conforte e me dê uma nova companheira para amenizar a dor da perda desse amor que estava se tornando muito importante na minha vida saiba eu amo todos vocês que me acompanham e que tiram um pouco de seu tempo para ler as minhas postagens, umas vocês gostam, outras detestam e assim esse blog se tornou um sucesso, obrigado por tudo, eu não vou acabar o blog, vou só dar um tempo enquanto me recupero dessa dor em meu coração Deus abençoe a todos.
ResponderExcluirIsrael Batista
e não esquecerei o blog do sanharol, que sai desse pra criar o meu abraços
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