O INFERNO
A escolta de 10 demônios
A escolta de 10 demônios
Seguimos com os dez demônios. Durante a nossa jornada eu pude ter uma noção melhor de todo o vale e do breu fervente. Observei que, como os golfinhos que mostram suas costas acima da água, eventualmente um pecador mostrava as suas para aliviar por um instante seu sofrimento, e logo tornava a mergulhar. Outros ficavam à beira da fossa, mas submergiam assim que Barbariccia aparecia.
Vi então um pecador que, vacilante, demorou para retornar à calda fervente. Antes que o coitado pudesse submergir, Graffiacane o capturou agarrando-o pelos cabelos. Os diabos gritavam:
- Ó Rubicante! Enfia tuas garras nas costas dele! Esfola! Rasga a pele!!
Enquanto os demônios gritavam, eu voltei-me para o mestre e perguntei:
- Mestre, se puderes, descubra quem é este desgraçado que caiu nas mãos de seus adversários.
Meu guia se deslocou até o pecador, perguntou de onde viera, e ele respondeu:
- Eu nasci e fui criado no reino de Navarra. Depois fui servo do bom rei Tebaldo e lá aprendi a arte da barataria. Agora pago a conta neste caldo quente.
Ciriatto, que tinha duas presas no rosto que nem javali, fez-lhe sentir como uma só poderia rasgá-lo. Mas Barbariccia interveio, agarrando-o.
- Aproveita enquanto eu o seguro! - disse Barbariccia a Virgílio - Se quiseres que ele fale mais, continue a interrogá-lo antes que os outros o dilacerem.
- Então dize-me - continuou Virgílio - conheces algum latino lá embaixo?
- Eu estava com um agora há pouco. Queria eu estar lá embaixo com eles para não receber estas garfadas.
- Já esperamos demais! - gritou Libicocco, que com um garfo arrancou-lhe um pedaço do braço. Draghinazzo já ia furá-lo com o quinhão mas desistiu assim que percebeu que o decurião Barbariccia olhava para ele, irritado.
- Mas quem é aquele com quem disseste estar há pouco no caldo fervente? - continuou o mestre. - Era o frei Gomita de Gallura, soberano especulador. - respondeu o condenado - Vive ele a conversar com Dom Michel Zanche sobre a Sardenha. Ai! Mas olha só o diabo como ri! E apontava para um demônio bem próximo olhando para ele. Eu poderia te falar mais, mas temo que esse demônio se zangue e venha me torturar!
Mas Barbariccia virou-se para Farfarello, que já avançava, gritando:
- Te afasta, ave de rapina nojenta!
- Se quiseres ver toscanos e lombardos - continuou o pecador -, eu os farei vir aos montes! É preciso, porém, que os Malebranche se afastem, pois eles os temem. Eu, sozinho, sem sair deste lugar, farei vir sete deles com um simples assobio. É o nosso sinal para indicar que algum de nós está fora.
- Olha só a trapaça que ele armou para escapar! - disse Cagnazzo, rindo e sacudindo a cabeça.
- Trapaceiro eu sou - respondeu o esperto -, especialmente se for para trazer desgraça aos meus companheiros.
Mas Alichino queria ver para crer e o desafiou:
- Se tu mergulhares eu não correrei atrás de ti, pois tenho asas para te alcançar. Nós te deixaremos livre e ficaremos atrás do vale. Veremos se és mais rápido que nós.
E então todos tomaram o rumo do vale, começando com o que se opunha àquele jogo. Astuto, o corrupto saltou e conseguiu fugir. Alichino não conseguiu alcançá-lo. Calcabrina, irado, correu atrás também, torcendo que o danado escapasse para armar uma briga com Alichino. Assim que o pecador submergiu ele saltou em cima do seu irmão, e ambos se enroscaram no ar sobre o piche. Os dois começaram a se mutilar com suas garras até que caíram na pez fervente. O calor foi suficiente para separá-los, mas não conseguiam sair do poço, pois suas asas estavam encharcadas. Saíram então todos os outros diabos para os socorrer.
E lá os deixamos, naquela confusão, e continuamos sozinhos.
Vi então um pecador que, vacilante, demorou para retornar à calda fervente. Antes que o coitado pudesse submergir, Graffiacane o capturou agarrando-o pelos cabelos. Os diabos gritavam:
- Ó Rubicante! Enfia tuas garras nas costas dele! Esfola! Rasga a pele!!
Enquanto os demônios gritavam, eu voltei-me para o mestre e perguntei:
- Mestre, se puderes, descubra quem é este desgraçado que caiu nas mãos de seus adversários.
Meu guia se deslocou até o pecador, perguntou de onde viera, e ele respondeu:
- Eu nasci e fui criado no reino de Navarra. Depois fui servo do bom rei Tebaldo e lá aprendi a arte da barataria. Agora pago a conta neste caldo quente.
Ciriatto, que tinha duas presas no rosto que nem javali, fez-lhe sentir como uma só poderia rasgá-lo. Mas Barbariccia interveio, agarrando-o.
- Aproveita enquanto eu o seguro! - disse Barbariccia a Virgílio - Se quiseres que ele fale mais, continue a interrogá-lo antes que os outros o dilacerem.
- Então dize-me - continuou Virgílio - conheces algum latino lá embaixo?
- Eu estava com um agora há pouco. Queria eu estar lá embaixo com eles para não receber estas garfadas.
- Já esperamos demais! - gritou Libicocco, que com um garfo arrancou-lhe um pedaço do braço. Draghinazzo já ia furá-lo com o quinhão mas desistiu assim que percebeu que o decurião Barbariccia olhava para ele, irritado.
- Mas quem é aquele com quem disseste estar há pouco no caldo fervente? - continuou o mestre. - Era o frei Gomita de Gallura, soberano especulador. - respondeu o condenado - Vive ele a conversar com Dom Michel Zanche sobre a Sardenha. Ai! Mas olha só o diabo como ri! E apontava para um demônio bem próximo olhando para ele. Eu poderia te falar mais, mas temo que esse demônio se zangue e venha me torturar!
Mas Barbariccia virou-se para Farfarello, que já avançava, gritando:
- Te afasta, ave de rapina nojenta!
- Se quiseres ver toscanos e lombardos - continuou o pecador -, eu os farei vir aos montes! É preciso, porém, que os Malebranche se afastem, pois eles os temem. Eu, sozinho, sem sair deste lugar, farei vir sete deles com um simples assobio. É o nosso sinal para indicar que algum de nós está fora.
- Olha só a trapaça que ele armou para escapar! - disse Cagnazzo, rindo e sacudindo a cabeça.
- Trapaceiro eu sou - respondeu o esperto -, especialmente se for para trazer desgraça aos meus companheiros.
Mas Alichino queria ver para crer e o desafiou:
- Se tu mergulhares eu não correrei atrás de ti, pois tenho asas para te alcançar. Nós te deixaremos livre e ficaremos atrás do vale. Veremos se és mais rápido que nós.
E então todos tomaram o rumo do vale, começando com o que se opunha àquele jogo. Astuto, o corrupto saltou e conseguiu fugir. Alichino não conseguiu alcançá-lo. Calcabrina, irado, correu atrás também, torcendo que o danado escapasse para armar uma briga com Alichino. Assim que o pecador submergiu ele saltou em cima do seu irmão, e ambos se enroscaram no ar sobre o piche. Os dois começaram a se mutilar com suas garras até que caíram na pez fervente. O calor foi suficiente para separá-los, mas não conseguiam sair do poço, pois suas asas estavam encharcadas. Saíram então todos os outros diabos para os socorrer.
E lá os deixamos, naquela confusão, e continuamos sozinhos.
No Canto XXIII veremos a vala dos hipócritas
26/07/2011
É...
ResponderExcluirOs Corruptos barateiros são os acusados de barataria, quer dizer: Ação de dar tendo em vista um retorno em benefício pessoal.
Como exemplo, temos os JUÍZES que recebem propinas para alterar seu julgamento, ou os POLÍTICOS que só defendem os interesses de seus representados em troca de votos.
Veja você que a corrupção é um cancro milenar, e na atualidade, pouco ou nada mudou.
Aliás, retiro o que escrevi no paráfrafo anterior. A corrupção não mudou, mudaram os métodos punitivos, os corruptos atuais, não são mais punidos, são premiados com o apoio popular através do voto.
Isto não aconteceu com Frei Gomita era um frade da Sardenha, chanceler de Nino Visconti, governador de Pisa. Se envolveu com a venda de cargos públicos. Quando Nino descobriu que frade havia aceitado propina em troca da libertação de prisioneiros, mandou enforcá-lo.
A Divina Comédia foi uma das maiores obras literárias da idade média, e revela o pensamento do povo que naquela época, era dominado pelo poder da igreja e ameaçado pelas penas infernais, mas aspirava esperançoso a felicidade eterna do paraíso.
Os personagens envolvidos na trama, eram todos conhecidos ou contemporâneos da era Dante. A maioria era florentino.
Vicente Almeida
Pois é, Vicente, eu sempre venho falando que a Divina Comédia é mais do atual!
ResponderExcluirArtemisia, concordo com você: a corupção tão bolorenta, e infelizmente atualissima!
ResponderExcluirQuerido Vicente, obrigada pelo tempo que dedicas a este blog, a favor do nosso entretenimento. Abraço fraterno. Fatima.