Meu nome é Mundim do vale
Do Vale eu sou falador,
Conheço bem os costumes
De cada um morador.
Botar cadeira em calçada,
Decorar a taboada
SÃO COISAS DO INTERIOR.
Ambulância sem pneu
Posto médico sem doutor,
Estudante sem merenda
Escola sem professor.
Creche sem nutricionista,
Consultório sem dentista
SÃO COISAS DO INTERIOR.
Um menino acocorado
Chupando um enganador,
Quadro do Frei damião
Pregado no corredor.
Porco fuçando na lama,
Pinico embaixo da cama
SÃO COISAS DO INTERIOR.
Uma conversa fiada
De um barbeiro falador,
Histórias de lobisômens
Contadas por caçador.
Gaiola de macambira,
E uma banca de caipira
SÃO COISAS DO INTERIOR.
Um terço de penitente
Um vaqueiro aboiador,
Uma queima de caieira
Mentira de pescador.
Menino brincar de toca,
Uma queimada de broca
SÃO COISAS DO INTERIOR.
Um Rosário no pescoço
De um beato rezador,
Um banho numa biqueira
Para matar o calor.
As debulhas de feijão,
Festa de renovação
SÃO COISAS DO INTERIOR.
Uma camisa de mescla
Secando no coarador,
Um pinto sendo levado
Por gavião predador.
A casa de João de Barro,
Cachimbo fedendo a sarro
SÃO COISAS DO INTERIOR.
Um patrão assediando
A filha do morador,
Radiadora tocando
A música do sonhador.
Gente que nunca mentiu,
Nem no primeiro de abriil
SÃO COISAS DO INTERIOR.
Um delegado arbritário
Com cara de ditador,
Uma comarca vazia
Sem juiz nem promotor.
Um sujeito sem lisura,
Ser fiscal da prefeitura
SÃO COISAS DO INTERIOR.
Um evangélico pregando
A palavra do Senhor,
Um pai de santo atoado
Incorporando um cantor.
Pau de arara com romeiro,
Com destino ao Juazeiro
SÃO COISAS DO INTERIOR.
Um prato de porcelana
Com um pirão de corredor,
Um colchão feito de junco
Pro casal fazer amor.
Retrato na crstaleira,
Um pinguim na geladeira
SÃO COISAS DO INTERIOR.
Um circo sem empanada
Com um palhaço sem pudor,
Uma fila de católico
Para levar um andor.
Um pote na cantareira,
E um pau de sebo na feira
SÃO COISAS DO INTERIOR.
Um giral com rapadura
Um bule e um coador,
Uma venda na esquina
Sem entrar um comprador.
Placa “ Não vendo fiado “
E o dono muito zangado
SÃO COISAS DO INTERIOR.
Candidato prometer
Emprego para eleitor,
Bodegueiro se esconder
Quando chega um cobrador.
Penitência de cristão,
Sexta feira da paixão
SÃO COISAS DO INTERIOR.
Eu rimei com segurança
Sem tirar nada, nem por,
Porque poeta que mente
Tá ofendendo o leitor.
Nada aqui foi inventado,
Eu fiz tudo respaldado
NAS COISAS DO INTERIOR.
Mundim do Vale.
"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".
Dom Helder Câmara
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COMO ODES COM TANTA RIQUEZA DE DETALHES E TANTA MAESTRIA POÉTICA DESCREVER ASSIM AS COISAS DO INTERIOR.
ResponderExcluirPARABÉNS POR MAIS ESSA OBRA PRIMA POETA