A minha juventude em Várzea Alegre (mais precisamente no Sítio Sanharol), onde nasci e vivi até os 18 anos, foi marcada pela presença de personagens interessantes, às vezes hilários.
Poderia citar muitos, mas vou me reportar a Maria Grande, mulher de pele suave-marrom reluzente da cor de jabuticaba. De personalidade forte e aparência sincera, mantinha a perseverança e coragem dos seus amigos e parentes do Sítio Unha de Gato, localidade vizinha ao lugarejo onde morávamos.
Nas fases de entre safras de serviços particulares, trabalhava como doméstica nas casas dos menos afortunados, já que, à época, por quase toda a redondeza se espraiava a linha de pobreza. Às vezes sumia, para só reaparecer quando minha mãe ganhava mais um bebê. Era hora de cuidar do chamado “resguardo” da nova gestante, que demorava exatamente um mês após o parto. Não chegava a ser antipática mas, nas horas decisivas, ralhava com a gente e imprimia comando, tomando atitudes de gerentona, dando ordens emanadas dos nossos pais ou próprias também, suponho.
Nesses momentos, talvez tentando demonstrar atitudes e experiências, citava exemplos de causos passados, ditos populares e frases de efeito. Em um certo dia, um tanto agitado, meu pai se lamentava pelo fato de ter que adiar uma viagem com sua tropa de burros, em função de uma repentina chuva que chegara. Maria Grande, em um de seus chavões, como se tivesse gratidão pelo acontecido, dando meia volta na calçada exclamou: “há males que vêm para o bem”. E acrescentou, sem rodeios: “só assim vou ter tempo de preparar o jantar para você levar na viagem”.
Eu tinha aproximadamente sete anos à época e, só depois, é que vim interpretar melhor aquele dito popular expresso por nossa colaboradora do lar. Ao longo da vida, pude testemunhar que o paradoxo aparentemente rude de Maria Grande foi correlacionado em ocasiões diversas, tanto de ordem pessoal como de instituições, governos etc.. Quem já não se sentiu feliz por ter sido agraciado por uma benesse do céu o terrena, advinda de uma situação ou caso embaraço anterior?
Chega a ser bizarro citar casos exemplares que a própria sociedade sintetizou. Um deles, é de que as duas grandes guerras mundiais, apesar de terem ceifado milhões de vidas e de terem ocasionado prejuízos materiais incalculáveis, trouxeram avanços importantes nas ciências gerais, nas relações geopolíticas e no desenvolvimento sócio-econômico de muitas nações. No caso particular do nosso Brasil, temos exemplos de paradoxos advindos das ações desastrosas de governos, mais precisamente dos últimos presidentes José Sarney, Collor de Melo de FHC, Lula e Dilma, mas que, na visão do povão e até mesmo da mídia, possibilitaram avanços importantes para a posteridade.
Nos dias atuais, em que o Brasil está margeando a perigosa “desconfiança”, em que a moralidade é incógnita e o pacto civilizatório se revela frágil, em meio à insegurança e tanto desalento, parafraseando Rosemberg Cariry em seu artigo no jornal O POVO, de 22.11.2017, tomo licença metafórica e poética da figura de Maria Grande, fazendo-a pairar sobre o espírito da sociedade que, apesar de interpretar que as autoridades nas esplanadas brasilianas, os fazedores das leis e corregedores da justiça só estão fazendo maldade, no futuro próximo, cairá sobre o Brasil milhares de milhões de vergonha na cara, cento e vinte milhões de insubmissão, quinhentos milhões de auto-estima, três bilhões de senso de liberdade e justiça e cinco trilhões de igualdade e fraternidade. Afinal, “há males que vêm para o bem”.
Antonio Alves Feitosa, o pai de Dudau sempre que lhe contavam uma historia ele respondia : pior poderia ser. Quando lhe contaram que Maria Piquiasr estava esperando um filho de Piquiar ou seja filha e pai ele disse : pior poderia ser. Questionado como poderia ser pior respondeu : Piquiar ter um filho de Maria.
ResponderExcluirPai você é show...belo texto!
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