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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


segunda-feira, 8 de julho de 2024

MIGRAÇÃO E DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO DE VÁRZEA ALEGRE- Por Antonio Gonçalo.

O processo migratório dos nordestinos teve início, ou pelo menos se acentuou a ponto de ser notícia, com o “Primeiro Ciclo da Borracha”, em 1879, quando pessoas dos estados do Nordeste partiam para a região Amazônica e se repetiu durante a segunda guerra mundial (1940 a 19450), época em que o governo criou a Inspetoria de Trabalhadores Migrantes. 

Mas, de Várzea Alegre, talvez tenham sido poucos os que acompanharam aqueles viajantes. Com o auge da industrialização, no período 1950 – 1970, o fluxo de migrantes da região mudou o rumo para o Sul do país, mais especialmente para os estados de São Paulo e Rio de Janeiro. 

Nesse período, houve acentuado aumento na migração dos varzealegrenses. As causas desses ciclos também teve muito relacionado com as intempéries climáticas da região. A seca fez e faz parte do Sertão Nordestino, e Várzea Alegre, a um passo da região do Cariri, no Ceará, de clima ameno, sempre sofreu os revezes e consequências de anomalia dessa intempérie, que muito tem  massacrado as pessoas e animais.

Sabe-se que as situações não eram e nem são favoráveis, e é fácil reconhecer que poucos deixam seu lugar por desejo próprio, exceto pela vontade de melhorar de vida. E o varzealegrense teve e tem ânsia por manter-se corajoso e altivo. Portanto, muitos saíram e foram embora, em busca de dias melhores.

Paulo de Brito Guerra, no livro “A Civilização da Seca”, descreve-a de atemporal socioeconomicamente. No capítulo “O Fenômeno Fatídico”, justifica a diversidade de designações e interpretações de causas e efeitos da intempérie que, particularmente no Nordeste Brasileiro, tem particularidades, visto que na região, comumente há um ciclo basicamente definido de verão de seis em seis meses aproximadamente.

Sendo assim, ele explica de forma veemente: “a menor seca representa um período de dezoito meses sem chuvas, pois a época teoricamente chuvosa – janeiro a junho – vem situada entre dois semestres, já naturalmente secos – julho a dezembro. Seca de dois anos são trinta e seis meses secos. A estiagem provoca êxodo rural, deixa o campo esvaziado". 

É que os sertanejos são forçados a migrar para centros urbanos de outra região. Há relatos históricos de secas, nos séculos XIX e XX, com eventos significativos em 1877 – 1879; 1915, 1932, 1970, 1980 - 1983; 1993 – 1994; 1998 – 1999 e os que o Ceará atravessa constantemente. 

Por sorte ou designo de Deus, o varzealegrense, quando começou a migrar, teve um destino definido, talvez, pelo conhecimento de desbravadores do lugar, como, o folclórico José Felipe, que no seu caminhão “misto” iniciou viagens transladando conterrâneos para o sul do país em viagens que duravam até 15 dias; ou mesmo os empresários Raimundo Ferreira e Zezito, fundadores das empresas Varzealegrense e Real Caririense, respectivamente.  

Joaquim Alves Bezerra e José Gonçalo Araripe, ambos ex-funcionários da Empresas Real Caririense, e com longos tempos vividos em São Paulo, comentam com propriedade que aqueles abnegados empresários tiveram papel importante no desenrolar da crescente migração. 

No início da década de 50, se fazia a vagem de forma bastante precária, em veículos de qualidade deficiente, com viagens quase que intinerantes, com formas de pagamentos amigáveis e basicamente sem uma pretensão maior de riqueza por parte dos

empreendedores, decerto pela própria condição financeira irregular dos transeuntes.

Alicerçados na experiência daqueles empresários de transportes, o destino do varzealegrense passava pela estação do Braz, em São Paulo, que se integrava com a rede férrea que iria para a região do ABC, onde nas décadas de 50 e 60, com o incentivo dos governos Getúlio Vargas e Jucelino Kubstheck, iniciavam o impulso da industrialização do país, com ênfase para as montadoras de Altomóveis. 

Portanto, o varzealegrense migrante foi se instalando, pode-se dizer rapidamente, nas cidades de Santo André, São Caetano e São Bernardo. Com esse entrelace de logística no transporte, fica evidente a vantagem que o migrante varzealegrense levou em relação aos demais, em escolher a região do ABC para morar e trabalhar. 

É que ali a oferta de trabalho nas fábricas que iam se instalando era crescente e, por ainda não exigir maiores conhecimentos técnicos, à época, pessoas pouco letradas poderiam encontrar empregos com boas remunerações e com perspectivas de crescimento profissional para aqueles com maior grau de instrução. 

Sem contar com a gama de serviços à disposição dos trabalhadores, bancados pelas próprias fábricas, por associações, entidades de classe, SENAI, SENAC etc.

Essa escolha inicial vitoriosa, foi impulsionando a avidez dos que ainda residiam aqui, como que um crescimento virtuoso, já que tios que já tinham ido influenciaram pais, que por sua vez, influenciaram filhos e assim por diante, fazendo crescer cada vez mais o fluxo de pessoas que se dirigiam de Várzea Alegre para morar em São Bernardo do Campo, onde estima-se que vivam aproximadamente 80% dos migrantes e seus descendentes.

Esse fluxo foi tamanho, que nas décadas de 60 e 70 do século passado chegavam a sair três ônibus semanalmente direto de Várzea Alegre para São Paulo.

A partir da década de 1980, com o declínio da produção industrial, a migração de nordestinos para o Sul passou a diminuir gradativamente, surgindo outros pontos de atração polinucleados, como o Distrito Federal e a Região Norte do país. 

Esse ciclo, o varzealegrense acompanhou, inclusive, com um fator diferenciado: é que muitos, de posse de empregos razoáveis e outros já aposentados, tomaram o rumo de volta ao torrão natal. Chegando em Várzea Alegre, com um repouso econômico oriundo do trabalho em São Paulo, os “regressantes” passaram a incrementar os fatores sócio-econômicos do município.

Além da melhoria ocasionada diretamente no comércio, o ingresso desses recursos financeiros incrementaram também a construção civil e até mesmo a indústria. Várzea alegre, nas últimas três décadas tem mudado sua aparência em termos de infra-estrutura urbana e as edificações residenciais melhoraram bastante de aspectos, com novas formas e linhas arquitetônicas modernas. 

É certo que não se pode conferir essa pujança apenas à chegada de capitais agregados aos conterrâneos que voltam do Sul do país, pois sabe-se que outros fatores também participaram dessa mudança, inclusive os programas sociais do governo e as melhorias nas condições laborais e de escolaridade da população.

2 comentários:

  1. Tem muita gente da minha família e amigos de Várzea Alegre que foram embora para São Bernardo do Campo-SP, onde fincaram residências, principalmente no Bairro Ferrazópoles Em 1990 fui lá a passeio, quando encontrei com muitos deles.

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