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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


sábado, 16 de abril de 2011

CARTA DE PERO VAZ - Por Mundim do Vale

POESIA LIMEIRIANA


Meu generoso amigo Mundim do Vale me enviou mais uma de suas obras. Dessa vez o tema é a carta escrita por Pero Vaz, quando do descobrimento do Brasil. Só que em uma versão limeiriana, que todo mundo sabe que era fantástico em rima e métrica, mas deixava a desejar na fidelidade aos fatos históricos. Afinal é de Zé Limeira a glosa que diz:


Pedro Álvares Cabral
Inventor do telefone
Começou tocar trombone
Na banda do Zé Leal.
Mas como tocava mal
Injeitou três instrumento
Jesus saiu lá de dento
Correndo atrás duma lebre
Quem for podre que se quebre
Diz o novo testamento.


Vejamos como ficou a carta limeiriana de Mundim do Vale. E obrigado, Mundim, por mais essa colaboração!


Carta de Pero Vaz segundo Zé Limeira

Mundim do Vale

Certa vez lá em Natal
Limeira tava cantando
Todo tempo misturando
Mossoró com Portugal.
Falava de carnaval
Numa casa de farinha,
Até que Zé de Ritinha
Perguntou: - Tu é perito?
Pois rime o que tava escrito
Na missiva de Caminha.

Rimo porque sei rimar
Carta, recado e cartilha
Tratado de Tordesilha
E Cabral em alto mar.
Rimo o rei a reclamar
Das viagens da rainha,
Gastando tudo que tinha
De Portugal pro Egito.
E agora rimo o escrito
Da missiva de caminha.

A carta:

Senhor rei de Portugal
Aos vinte e nove de abril
De um tronco de pau Brasil
Escrevo a carta real.
A viagem foi normal
Com as graças de Jesus
Que nos mostrou uma luz
Para uma ação pioneira.
Onde ergui sua bandeira
Na terra de Vera Cruz.

A terra aqui é tão boa
Que até já me acostumei
Confesso para o meu rei
Que já esqueci Lisboa.
A nativa sobe à toa
Na árvore pra chupar manga
Vestida só com uma tanga
Com o peito descoberto.
A gente olha bem de perto
E danada nem se zanga.

Não vou mais voltar aí
Pra não ter que trabalhar
Pois levo o tempo em pescar
E comer Índia tupy.
Vou ficar mesmo é aqui
Porque não sou abestado
Me esqueça no seu reinado
Que aqui tudo é maravilha.
Já comi até a filha
Do chefe Touro Deitado.

Tou fazenda um relatório
De tudo que acontece,
Dos índios fazendo prece
Na frente do oratório.
Já montei meu escritório
Na taba do feiticeiro,
Mas mande pena e tinteiro
E também papel paltado,
Que estou comprando fiado
De um cigano estradeiro

Os ídios quarem adotar
O costume português.
O vício da embriagues
E a mania de trocar.
Não tenho como evitar
Essa permuta ilegal
Porque o próprio Cabral
Vive trocando arruela.
E até a índia mais bela
Já foi trocada por sal.

Quero também avisar
Pra meu rei tomar ciência
Que precisa providência
Urgente nesse lugar.
Os europeus vão chegar
Mudando a religião.
Vai chegar também ladrão
Para furtar à vontade,
Daí nasce a impunidade
Para a futura nação.

Chegou aqui um francês
Que é metido a bichinha
Ele esculhamba a rainha
E tudo quanto é português.
Aconteceu certa vez
Aqui no Monte Pascoal
Que ele assediou Cabral
Oferecendo o caneco.
Cabral quase teve um treco
Lá dentro do matagal.

Aqui já apareceu
O tal do esquentamento
Precisa medicamento
Que muita gente morreu.
Escute esse servo seu
Pra coisa não desandar,
A corte tem que mandar
Um médico para esse povo.
Eu mesmo já tou com um ovo
Em tempo de cozinhar.

Aqui já tem confusão
De índio com português
Já é a terceira vez
Que eu faço intervenção.
O nativo faz questão
De uma vida reservada,
Sem calçar nem vestir nada
E meu rei tem que entender
Que faz gosto a gente ver
Uma nativa pelada.

Prepare um navio cargueiro
Pra trazer equipamento,
Mande birô e acento
Pra seu fiel cavalheiro.
Eu passo um mês inteiro
Vivendo nesse sufoco
Recebendo muito pouco
Nessa minha sub-vida.
Já tou com a bunda doída
De viver sentado em toco.

O meu rei deve lembrar
Que a terra foi Deus que deu,
Depois vem o europeu
Querendo se apossar.
Os índios não vão gostar
Dessa perversa invasão
E vão entrar em questão
Mas não vão levar vantagem,
Porque somente a coragem
Não pode vencer canhão.

Não é bom meu rei mandar
Jogadores nem detentos
Pois esses maus elementos
Só servem para furtar.
É bom a corte cortar
O mal cheiro pela essência,
Pra não gerar descendência,
Dessa raça malfazeja.
Evitando que um esteja
Um dia na presidência.

Sei que vossa majestade
É o nosso rei soberano
Mas desenvolvi um plano
Pra essa comunidade.
Mostre a vossa autoridade
Agindo com inteligência,
Munido de coerência
E coragem pra reinar,
Na hora de decretar
O ato da independência.

Se um dia meu rei vier
É melhor que venha só
Aqui se arranja xodó
Porque não falta mulher.
Índia não sabe o que quer
Nem manda botar baralho.
E pra findar meu trabalho
Assino na última linha.
Seu Pero Vaz de Caminha
Sarney Magalhães Barbalho.

Reprisado para: Flor das Bravas e o poeta Aldenízio Correia.

7 comentários:

  1. Prezado Mundim.

    Voce caprichou. Nada melhor do que rir, e, num dia de Sabado, vespera do Domingo melhor ainda. Rindo sem parar.

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  2. Mundim.

    Voce arrasou: Sarney Magalhães Barbalho.

    Como diz Magnolia - Valha.

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  3. Porque o próprio Cabral
    Vive trocando arruela.
    E até a índia mais bela
    Já foi trocada por sal.

    Pode um negocio desse?

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  4. Presado Mundim do Vale.

    Vi outro dia num desses sites uma sugestão de leitura sua para o Blog do Sanharol. Fiquei orgulhosa porque o Sanharol é o xodó do meu avô.

    Então pesquisei no Google - Mundim do Vale e o Sanharol e, para surpresa, minha duvida aumentou: Não sei se Mundim do Vale é mais Sanharol ou se o Sanharol é mais Mundim do Vale. Concluir serem a mesma coisas, dois irmãos siameses.

    Abraços.

    Thays Mamedio.

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  5. Obrigada, mais um vez. Acho que o Aldenísio bem merece uma homenagem como esta.
    Raimundinho, você é demais!

    Abraços.
    Flor das Bravas.

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  6. Valeu Mundin!

    Uma carta muito bem escrita no estilo de Zé Limeira, o Poeta do Absurdo. Esta poderia compor o livro do Orlando Tejo sobre o genial poeta do Chapadão do Teixeira, na Paraíba, sem deixar suspeita.

    Parabéns!

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  7. Mundin e Morais. Adorei...
    Mais parece a carta original de Pero Vaz de Caminha. Muito boa....KKKKKKKKKKKKK

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