Às vezes fico pensando que no meu tempo de criança as cidades conviviam melhor com os seus doidos (dizem que de louco, todos temos um pouco), já que eles integravam e participavam do dia-a-dia das pessoas. Penso até que o tipo de terapia adotado hoje em dia seja o ideal, e não a reclusão, o internamento, o isolamento da família e da sociedade, como era adotado à época. Contudo, apesar de trágico, a ausência daqueles personagens nas ruas parece deixar uma certa nostalgia. Ou é o sentido masoquista do ser humano que fala mais alto? O certo é que quase não os vemos mais nas ruas; a não ser nós mesmos, os loucos do cotidiano urbano.
Fiquei aqui pensando nos “Doidos” que Marcaram a minha infância e toda aquela nossa geração. Interessante! Foram muitos. Eita! Será que tô no meio deles? Quem sabe! Então comecei a recordar de alguns deles: Afonso Carro, Véio do Jibão, Antônio do Vige (essa era a pronúncia mesmo) Luiza Alexandre, Barba Azul, Anchieta, Antônio André, (esse passou muitos anos confinado, depois recuperou-se. (Ficou bom).
Afora outros tantos, que passaram por crises, mas ficaram anônimos pelo auxílio imprescindível dos familiares. Inclusive, alguns meus parentes próximos e amigos, que as famílias chegaram a manter acorrentados em casa mesmo.
Do “Antonio do Vige”, apesar de quase nunca tê-lo visto, eu e todo menino, tinha medo. Era, pelo que me lembro, o que nossas mães do Sanharol mais se utilizavam para apaziguar os ânimos exaltados dos meninos sapecas. As mães mantinham esses personagens como que arquivados na memória, para dispersar a atenção de algum filho que fizesse uma traquinagem ou mesmo um pedido “indesejável e impossível de ser atendido.
“Lá se vem Antônio do Vige.... Se você não pegar no sono agora mesmo, ele vem lhe pegar”. Era o suficiente para o cabra se safar e fechar logo os olhos com medo do doido aparecer de repente........ Do “Antonio do Vige”, apesar de quase nunca tê-lo visto, eu e todo menino, tinha medo. Era, pelo que me lembro, o que nossas mães do Sanharol mais se utilizavam para apaziguar os ânimos exaltados dos meninos sapecas. As mães mantinham esses personagens como que arquivados na memória, para dispersar a atenção de algum filho que fizesse uma traquinagem ou mesmo um pedido “indesejável e impossível de ser atendido.
“Chica do Rato”, gritavam os meninos ou até mesmo grandalhões interessados em ver o tempo mudar. “Chica do Rato tá debaixo da saia da tua M...... F. D. P.” respondia ela imediatamente. Saía descendo e subindo calçadas, como que oxigenada pela fúria daquele destempero que haviam lhe imposto. Mas, também deixava transparecer que se apoderava do apelido para despachar sua insanidade e falta de compreensão do mundo.
“Véio do Jibão”, era descendente da família tradicional que todos conhecemos. Pelo que se sabe, fora acometido por uma doença na infância (sarampo) e, a partir daí ficou trôpego, falando arrastado e com a visão distorcida (um pouco caraolho). “Fou pekar fossê”. Essa era uma frase emblemática que ele utilizava quando fitava os olhos de qualquer menino que deixasse transparecer que estava com medo dele. Eu, que era more prá xuxu, saia me “pelando”.
O “Barba Azul” era conhecido por sua imensa riqueza. Passava o dia desfilando pelas calçadas de Várzea Alegre, contando as suas dezenas, centenas, milhares de casas, prédios, terrenos...... Voltava conferindo. da Betânia ao Frejo Velho, do Alto da Prefeitura à Praça Santo Antonio, da Rua do Capim aos Grossos, tudo era dele. Esse, apesar de sua aparência extravagante: cabelos e barba pretos e compridos, roupas supostas umas nas outras e olhar fixo no infinito, não era importunado. Não havia nem alguém para contestar sua riqueza.
“Anchieta”, era o louco intelectual. Pelo que se sabe, fora acometido da doença quando estudava no Rio de Janeiro. A inteligência era tanta que, provavelmente tenha se confrontado com a falta de recursos financeiros da família. O seu pai era pobre. Tinha uma pequena oficina de ferreiro bem atrás da Uzina de Algodão de Josué Diniz. O Anchieta passava hoas e horas vagando pelas ruas da cidade. De paletó e gravata, lenço em contraste no bolço, sempre pitando um cigarro. Não falava com ningém, a não ser com ele mesmo, seu interior, quem sabe, inteiramente confuso. Terminou encarcerado em um pequeno quarto, próximo à oficina do pai.
Hoje, conheço poucos dessas personagens nas ruas ou nos arredores de Várzea Alegre. Um deles, conhecido por “Suíssa”, tem familiares na Rua Dr. Leandro, mas sua descendência é do Sanharol, mesmo bairro onde eu também nasci e me criei. Inclusive, ainda é meu parente e foi um dos maiores amigos de infância. Ele é magro, cor branca, conversa o que ninguém entende. Aparentemente, deixa transparecer não importunar ninguém. Contudo, uma das estripulias mais utilizadas pelo “Suíssa” é sair às ruas sem roupa. Isso mesmo: totalmente pelado. Dizem que ultimamente também tem se tornado um exímio “paquerador” das mulheres e já chegou até mesmo a importuná-las até na igreja, deixando o padre em apuros.
Antonio GONÇALO de SouzaSítio Sanharol – Várzea Alegre – CE.
Antonio GONÇALO de Souza
ResponderExcluirAnalista de Projetos
Banco do Nordeste
CENOP- FOR
Prezados amigos:
Antonio é filho do Senhor Mundim Gonçalo, neto de Antonio de Gonçalo Araripe, do sitio Sanharol e de Nenen Cesario do sitio Panelas.
Funcionario de carreira do BNB - Banco do Nordesta do Brasil.
Agradecemos sua colaboração e nos colocamos a disposição.
Blog do Sanharol.
Antonio.
ResponderExcluirUm belo texto. Um relato interessante. Fala de um passado não tão distante, do qual fomos testemunhas.
Muitos outros amigos e parentes não citados por voce sofreram e sofrem de demencia mental.
Epocas dificeis, sem meio de tratamentos ou medicação adequada.
Hoje em dia está bem melhor.
Obrigado pelo bom texto.
Parabens
Antônio,
ResponderExcluirSeja bem-vindo, caro amigo, você que acompanha o nosso blog como leitor a muito tempo agora colabora com este belo texto. Parabéns e continue nos ajudando,
Abraços!
Naquele tempo havia muitos casos de consanguinidade. No caso de Suissa, por exemplo, Tia Mariquinha(avó dele era casa com um sobrinho. Véio do Gibão os pais eram primos, etc,etc
ResponderExcluirquiz dizer !era casada1.
ResponderExcluirLendo a excelente matéria Doidos Pitorescos de Várzea Alegre do Sr.
ResponderExcluirAntônio Gonçalves Neto. Eu me lembrei dessa passagem lá no Sanharol dele.
PAI VAI DESCER TAMBÉM?
Raimundo Nonato Bitu.
ainda adolescente , tinha muito medo de doidos. Se sonhasse com Zé Carro Boi, era um mês sem andar na cidade.
Uma vez chegou um ciclista em Várzea Alegre, patrocinado pela Monark, para passar um dia e uma noite pedalando sem parar. A notícia espalhou-se no Sanharol, mais rápido do que bolinha de termômetro em piso de cerâmica.
Raimundo passou o dia dizendo que queria ver. Por mais que Vicente e Maria argumentassem que não tinha futuro, por conta da volta ser tarde, Raimundo não abria mão.
Quando foi por volta das cinco horas da tarde, ele entrou para trocar de roupa e Vicente Bitu sentou-se na calçada. Quando Raimundo saiu, foi logo dizendo:
- Pai! Eu já vou descer pra rua. Pai vai também?
- Vou não Raimundo. Eu vi Afonso Doido descendo e eu tenho medo de descer na hora que ele venha subindo ali pela lagoa do Arroz.
- Pois vamos pelo Alto do Tenente.
- Também não dar certo não, porque no Alto do Tenente é onde Zequinha Soares junta lenha pra fazer carvão.
- Pois quer saber de uma coisa? Eu também não vou mais descer não. Eu vou é subir pra casa de Carmelita, pra jogar baralho com os meninos.
Antôe Duvirge tocou fogo num quintal de Vicente Santiago. Vicente teve trabalho de apagar o fogo. Quando chegou em casa, Madrinha Ana, que era uma santa em pessoa, tinha dado janta a Antõe duvirge
ResponderExcluirAntôe Duvirge, você coma e suba!ordenou Vicente.
Ora, Vicente, eu vou é descendo e você quer que eu suba, respondeu ele.
Véio de João Martim chegou bem cedo na roça, o sol não tinha nem saido, as formiga atacaram seus pés e Véio batendo os pés e dizendo:
ResponderExcluirDiabo, e essas peste num dorme não?
Muito bom o texto e também pelo autor que me fez lembrar de muitas pessoas dessa família que conheci nos meus tempos de jovem. Conheci muito Mundim de Gongalo e família, mas isso faz tempo...Mas foi muito bom lembrar desse pessoal. Um abraço para a família.
ResponderExcluirEXCELENTE A ESTREIA DO PRIMO ANTONIO MUITO BOM MESMO Tb TIVE MUITO MEDO DE ALGUNS DOS CITADOS.
ResponderExcluirMaravilhosa a matéria intitulada "Doidos pitorescos de Várzea Alegre". Retrata um pouco de minha infância. Ô Rajalegre boa, só é longe. Sempre temos, todos nós, um pouco de loucura, nem que seja por Várzea Alegre.
ResponderExcluirE lamentavel que tem essas pessoas que vem ao mundo com estes disturbios mentais.E sofrido.Conheci alguns deles.
ResponderExcluirE lamentavel que tem essas pessoas que vem ao mundo com estes disturbios mentais.E sofrido.Conheci alguns deles.
ResponderExcluir