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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


domingo, 25 de junho de 2017

ADEUS ILUSÃO - Ricardo Noblat - Reprise, se toca Temer!


A faxineira ética foi uma ilusão que durou pouco. Seu ex-companheiro de luta contra a ditadura de 64, único ministro que pode dizer “Dilma me ama”, Fernando Pimentel, do Desenvolvimento, meteu-se com consultorias nada ortodoxas.

E como agiu Dilma? Mandou investigá-lo? Não. Mandou-o se explicar no Congresso? Também não. Ordenou: “Resista”. Nada demais. O quanto pode, Dilma segurou no governo os seis ministros que acabaram indo embora sob forte suspeita de envolvimento com corrupção. Digo: com malfeitos.

Se ela assim procedeu, revela-se agora apenas coerente ao orientar Pimentel a aferrar-se ao cargo. A fingir que está tudo muito bem, obrigado. Isso é lá comportamento de um presidente que proclamou sua aversão a desvios de condutas antes mesmo de subir a rampa do Palácio do Planalto pela primeira vez?

Está no seu discurso de posse: “Não haverá compromisso com o mal feito, a corrupção será combatida permanentemente”. Diante de indícios de que um auxiliar seu prevaricara, Itamar Franco, presidente da República, primeiro o afastava do cargo. Segundo mandava investigar os indícios. Caso eles ruíssem, chamava o auxiliar de volta.

Dilma? Bem que se esforçou para manter no governo os ministros abatidos por denúncias de corrupção.

Na última sexta-feira, ao desembarcar em Buenos Aires para a posse da presidente Cristina Kirchner, Pimentel limitou-se a declarar aos jornalistas: “Já falei tudo que tinha de falar. Todas as explicações foram dadas. Estou tranquilíssimo”. Não. Não falou tudo o que tinha de falar. Nem deu todas as explicações devidas.

Gilberto Carvalho, secretário-geral da presidência da República, socorreu Pimentel. “O governo está satisfeito com as explicações oferecidas pelo ministro até agora”, ditou. “Esclarecer o Congresso? Não vejo razão porque as denúncias são relativas a Belo Horizonte”.

Como é que é? Tem nova jurisprudência na praça? A intervenção de Gilberto soaria como piada se não tivesse sido feita a sério. Pimentel ganhou R$ 2 milhões em 2009 e 2010 dando consultorias em Minas Gerais e em Pernambuco.

Quer dizer que os fóruns competentes para ouvi-lo seriam as Assembléias Legislativas dos dois Estados? Por que não as Câmaras Municipais das capitais dos dois Estados?

Menos, Gilbertinho! “Se convocado, irei ao Congresso”, admitiu Pimentel. Pai, perdoai-os porque eles não sabem o que dizem! Era só o que faltava – o Congresso convocar alguém para depor e o convocado não comparecer.Convidado pode recusar o convite. Convocado é obrigado a ir. Arrisca-se a ser preso se não for.

Pimentel joga com as palavras para confundir o distinto e distraído público. O governo joga com sua força para evitar que o Congresso convoque Pimentel. Mais de uma proposta de convocação será votada esta semana na Câmara dos Deputados e no Senado. A ordem de Dilma é para sepultar todas elas. Receia que Pimentel se enrasque mais um pouco.

São tantas as perguntas a exigirem do ministro respostas convincentes, definitivas... Por que, de início, ele revelou que tivera apenas três clientes? Depois citou um quarto. Que disse não ganhar o bastante para pagar consultorias. Mas que em seguida recuou e deu razão a Pimentel.

Por que com três dos quatro clientes ele não assinou contratos? Foram contratos de boca, contou o ministro. Sabe como é... Na base da confiança. Do valor do precioso fio de bigode. (Pimentel não usa bigode.)

Por escrito, só o contrato de dois anos no valor de R$ 1 milhão com a Federação das Indústrias de Minas. Pimentel não lembra quantas vezes esteve com o seu melhor cliente. Nem seu melhor cliente lembra quantas vezes o recebeu.

Diretores da federação cochicham que jamais souberam do contrato assinado com Pimentel. Ganha um bolo de rolo quem tiver visto Pimentel dando consultoria em Pernambuco. Onde estão os documentos capazes de provar que o serviço comprado a Pimentel de fato foi prestado. Não existem, simplesmente. Ou se existem Pimentel não quer exibi-los.

O comum em casos de consultoria é que se detalhem por escrito dias, horários de reuniões, locais, nomes dos participantes, temas discutidos, projetos apresentados, e por aí vai. Consultoria serve também para lavar dinheiro e montar Caixa 2 de campanha. Robson Andrade, ex-presidente da federação mineira, assim justifica a contratação de Pimentel: Quanto vale um dia de conversa com uma pessoa que tem conhecimento estratégico sobre como trabalhar com o governo, discutir questões tributárias, ações de crescimento nas indústrias?

Convenhamos: faz sentido. Assim como fez para os que contrataram Antonio Palocci – um dos coordenadores da campanha de Dilma e mais tarde chefe da Casa Civil. Ficou milionário. Pimentel, não. Na época em que ingressou no vantajoso e atraente mundo das consultorias, Pimentel era ex-prefeito de Belo Horizonte. Ambicionava o governo de Minas.

Por ordem de Lula, o PT apoiou Hélio Costa, candidato do PMDB à sucessão de Aécio Neves. Restou a Pimentel concorrer ao Senado. Perdeu para Itamar. Estava destinado a ser ministro de Dilma. Foi um dos coordenadores de sua campanha. Quem não pagaria caro para tê-lo como conselheiro?

Lula foi tolerante com autores de malfeitos. Dilma também, mas sem o sucesso dele. Nenhum dos ministros que abandonou o governo tinha com ela a íntima ligação que Pimentel tem. É razoável, portanto, que Pimentel acabe ficando. Ocorre que tudo na política cobra o seu preço. E algum será pago por ele, por Dilma ou pelos dois. Esperem para ver.

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