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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


quinta-feira, 31 de maio de 2012

O papel de um advogado

(Publicado por Augusto Nunes em seu blog comentando a defesa de um bandido por um ex-ministro da Justiça)


Episódio protagonizado pelo advogado Heráclito Fontoura Sobral Pinto e pelo poeta Augusto Schmidt. E merece ser ouvido ao menos uma vez por gente que se vale da competência profissional e da astúcia congênita para favorecer a institucionalização da injustiça, para impedir a punição dos culpados e para dar passagem aos inimigos do estado democrático de direito.
Sobral e Schmidt eram amigos de muitos anos quando conversaram por telefone em 16 de outubro de 1944. Além de versos, Schmidt sabia também fazer dinheiro como editor, intermediário de transações financeiras e ocupante de cargos públicos. Naquele dia, foi o empresário quem ligou, para pedir ao jurista que reservasse todo o dia 20 ao exame da documentação que lhe permitiria representá-lo numa causa de natureza trabalhista.

Sobral informou que, antes de aceitar o serviço, teria de verificar se o candidato a cliente tinha razão. Advogado não é juiz, replicou Schmidt. Ouviu outra vez que o convite só seria aceito depois do exame eliminatório. Como tudo teria de ser feito até o dia 21, ponderou Sobral, Schmidt talvez devesse contratar outro defensor. A conversa não deve ter terminado bem, atesta a carta remetida pelo advogado no dia seguinte.

É uma luminosa aula de Direito. E uma irretocável lição de vida.
“O primeiro e mais fundamental dever do advogado é ser o juiz inicial da causa que lhe levam para patrocinar”, ensina o doutor Sobral. “Incumbe-lhe, antes de tudo, examinar minuciosamente a hipótese para ver se ela é realmente defensável em face dos preceitos da justiça. Só depois de que eu me convenço de que a justiça está com a parte que me procura é que me ponho à sua disposição”. A regra vale também para velhos amigos? Claro que sim: “Não seria a primeira vez que, procurado por um amigo para patrocinar a causa que me trazia, tive de dizer-lhe que a justiça não estava do seu lado, pelo que não me era lícito defender seus interesses”.

Vista por Sobral Pinto, “a advocacia não se destina à defesa de quaisquer interesses. Não basta a amizade ou honorários de vulto para que um advogado se sinta justificado diante de sua consciência pelo patrocínio de uma causa. (…) O advogado não é, assim, um técnico às ordens desta ou daquela pessoa que se dispõe a comparecer à Justiça. (…) O advogado é, necessariamente, uma consciência escrupulosa ao serviço tão só dos interesses da justiça, incumbindo-lhe, por isto, aconselhar àquelas partes que o procuram a que não discutam aqueles casos nos quais não lhes assiste nenhuma razão”.

A aula termina com palavras que deveriam ser reproduzidas em bronze nos pórticos das faculdades de Direito: “É indispensável que os clientes procurem o advogado de suas preferências como um homem de bem a quem se vai pedir conselho. (…) Orientada neste sentido, a advocacia é, nos países moralizados, um elemento de ordem e um dos mais eficientes instrumentos de realização do bem comum da sociedade”.

Pelo que andam fazendo nestes tempos estranhos, raríssimos bacharéis concordam com Sobral Pinto. Não lhes interessam atenuantes que abrandem o castigo merecido, não lhes passa pela cabeça dar razão a quem tem. Preferem recitar que todo acusado tem direito a um advogado — uma verdade que ninguém contesta — e imediatamente abrir o cortejo de mentiras promovido para manter em liberdade clientes sabidamente culpados.

No Brasil da Era Lula, os bacharéis que cobram por hora, assumem sem constrangimentos o papel de cúmplice de bandidos irrecuperáveis.
Pena que o doutor Sobral não tenha vivido para, em mais uma carta irretocável, dizer-lhes claramente o que são.

2 comentários:

  1. Prezado Armando.

    Antonio de Satiro, jovem estudante varzealegrense fez vestibular para direito sendo aprovado entre os primeiros. Isto na decada de 40 do seculo passado. Retornando a casa dos pais, colocou um terno e se empertigou diante de um espelho e falou: Meretrissimo Juiz de direito, Senhor promotor de justiça, senhores jurados: este jovem matou a avó para roubar, mas ele tinha razão.

    Parou, fez uma pausa, e declarou: isso não é profissão para mim.

    Voltou a Fortaleza e fez vestibular para odontologia sendo aprovado, concluindo o curso e dedicando sua vida a profissão.

    Na historia da advocacia brasileira vale tudo.

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  2. Morais um assunto puxa outro.
    Não assisti (não perderia meu tempo)mas o magote anda todo ouriçado com o horário eleitoral gratuído(?) do Programa do Ratinho.

    No programa, parecia até encontro de comadres, tal a vulgaridade dos lances) o “Cara” voltou a ser o falastrão de sempre:

    “Eu não vou permitir que um tucano volte à presidência do Brasil” (Lula, admitindo sua candidatura e sem explicar como fará para “deletar” os tucanos)

    Da empáfia do “Cara” podemos fazer as seguintes ilações:

    1 -- Se Lula não teve escrúpulos em violar mais uma vez a Lei Eleitoral para promover seu candidato a prefeito, por que os teria em pedir a ministros do STF o adiamento do julgamento do mensalão?

    2 -- A petulância e a arrogância de Lula trouxe uma preocupação aos que não se deixam levar pelo “canto da sereia” dele: a declaração que será candidato a presidente na próxima eleição “se Dilma não quiser continuar”. Uma das exigências da democracia é alternância do poder. O grupelho parece querer se apossar do poder indefinidamente, como o outro falastrão, o Chávez da Venezuela.

    3 -- A oposição brasileira é tão fraca, que já deveria ter entrado com uma ação no TSE contra o PT por causa da entrevista de Lula e Fernando Haddad a Ratinho, na última 5ª feira. Na prática ocorreu propaganda antecipada do candidato petista à Prefeitura.Segundo o TSE, propaganda eleitoral gratuita no rádio e na TV só a partir de 21 de agosto.

    Pobre Brasil!

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