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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


domingo, 2 de junho de 2013

O CASAMENTO DOS VELHOS


Tem certas coisas no mundo    
Que eu morro e num acredito    
Mas essa eu conto de certo    
Dum casamento bonito          
De um viúvo e uma viúva        
Bodoquinha Papaúva            
E Tributino Sibito            

O véio de oitenta ano          
Virado num estopô              
A véia setenta e nove          
Maluca por um amor            
Os dois atrás de esquentar    
Começaram a namorar            
Porque um doido ajeitou        

Um dia o véio comprou          
Um corpete pra bodoquinha      
Quando a véia foi vestir      
Nem deu certo, coitadinha      
De raiva quase se lasca        
Que o corpete tinha as casca  
Mas os miolo num tinha        

No dia três de abril          
Vêi o tocador Zé Bento        
Mataram trinta preá            
Selaram oitenta jumento        
Tributino e Bodoquinha        
Sairam de manhazinha          
Pra cuidar do casamento        

O veiao saiu vexado            
Foi se arranchar na cidade    
Mandaram chamar depressa      
Naquela oportunidade          
O veiao chegou de choto        
Inda deu catorze arroto        
Que quase embebeda o padre    

O padre ai perguntô:          
Seu Tributino, o que pensa,    
Quer receber Bodoquinha        
Sua esposa, pela crença?      
O veiao dixe: eu aceito        
Tô tao vexado dum jeito        
Chega tô sem paciência        

E preguntô a Bodoquinha:
Se aceitar esclareça
A véia lhe arrespondeu
Dando um jeitim na cabeça
Aceito de coraçao
Tô cum tanta precisao
Tô doida que já anoiteça

Casaram, foram pra casa
Comeram de fazer medo
Conversaram duas horas
Uns assuntos duns segredo
E Bodoquinha dixe: agora,
Meu pessoá, vao embora
Que eu quero drumi mais cedo

O véi vestiu um pijama
Ficou vê uma raposa
A véia de camisola
Dixe: óia aqui sua esposa
Cuma é, vai ou num vai?
O veiao dixe: ai, ai, ai
Já  tá  me dando umas coisa

A véia dixe me arroche
Cuma se novo nóis fosse
O véio dixe: ê minha véia
Acabou-se o que era doce
A véia dixe: é assim?
Entao se vai dar certim
Que aqui também apagou-se

Inda tomaram uns remédio
Mas num deu jeito ao enguiço
De noite a véia dizia:
Mas meu véi, que diabo é isso?
Vamo vendê essa cama
Nóis sempre demo na lama
Ninguém precisa mais disso

A véia dixe: isso é triste
Mas esse assunto eu esbarro
Eu já bati o motor
Meu véi estrompou o carro
Ê, meu veiao Tributino
Nóis dois só tem um menino
Se a gente fizer de barro


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