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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


terça-feira, 7 de fevereiro de 2023

O último prefeito "udenista" de Crato -- por Armando Lopes Rafael

  José Horácio Pequeno/ Credito: foto sobre foto:Wilson Bernardo

   Durante cerca de vinte anos – após a redemocratização do Brasil em 1946, com o fim da longa ditadura de Getúlio Vargas – um partido político, a União Democrática Nacional-UDN elegeu seguidamente todos os prefeitos de Crato.

   E a UDN só perdeu o comando político da (então) mais importante cidade caririense, por consequência da dissidência de uma importante e honrada liderança udenista local: o Sr. José Pinheiro Esmeraldo. Este era o candidato natural da UDN a prefeito de Crato nas eleições de 1962. No entanto foi preterido por membros do diretório municipal da sigla, que preferiram homologar o Dr. Derval Peixoto como o candidato da UDN. Desgostoso com a quebra do compromisso anteriormente firmado, José Esmeraldo se lançou por outra agremiação política, obtendo mais de mil e seiscentos votos, número elevado para aquela época. Com a UDN dividida, o vitorioso no pleito de 3 de outubro de 1962 foi o professor Pedro Felício Cavalcanti, candidato do PSD, partido que  pela primeira vez -- chegava ao poder em Crato.

José Horácio Pequeno foi assim o último prefeito udenista de Crato.
    Eleito em 1958 cumpriu seu mandato até início de 1963. Nascido em 29 de julho de 1895 ele era filho de Horácio Jácome Pequeno e de Maria de Alencar Pequeno, esta irmã do famoso coronel Nelson Alencar, do Lameiro. Horácio Jacome teria passado a vida no anonimato, não fosse o fato de ter sido assassinado – na trágica noite de 7 de novembro de 1903 – por sicários da guarda particular do então chefe político de Crato, José Belém de Figueiredo, fato ocorrido durante uma serenata. Esse assassinato foi o pivô da revolta popular – liderada pelo Coronel Antonio Luiz Alves Pequeno – que apeou do poder o Coronel José Belém de Figueiredo.

    José Horácio Pequeno descendia de importantes e tradicionais famílias cratenses, mas, devido ao atraso do meio em que vivia, pouco estudou. Isso não o impediu de se tornar um destacado comerciante de rapadura, farinha de mandioca, sementes oleaginosas e peles de animais, produtos de muita comercialização naquele tempo. Além do mais, ele gozava da fama de ser rigorosamente honesto em tudo que empreendia. Já como prefeito de Crato, enfrentou dificuldades não pensadas. A começar pelo fato de ser oposição ao governador do Ceará daquele quatriênio, Parsifal Barroso, este filiado ao PTB. Encontrou ainda uma arrecadação na Prefeitura bem pequena, que mal cobria o pagamento do funcionalismo municipal.

   Além disso, José Horácio sempre ajudou os pobres de Crato e levou esse costume para a Prefeitura. Todos os dias muitos o procuravam e quase  ninguém saía de lá com as mãos abanando. Finalmente, ele não contou com uma boa assessoria para ajudá-lo a administrar o Crato. Seu mandato como prefeito coincidiu com o início de profundas mudanças e avanços tecnológicos, que varreria todo o mundo, e, consequentemente, o Cariri.  Estas, algumas razões porque sua administração passou marcada, inegavelmente, com pouco brilho.

    Para piorar o quadro, o início da década 60 marcou também o começo do vertiginoso crescimento da vizinha cidade de Juazeiro do Norte, o que ofuscou a liderança que o Crato exercera isoladamente, até então, no Cariri. Só para citar um dado: com o advento da energia elétrica da Chesf ao Cariri, a cidade que naturalmente deveria receber a sede da Celca (Companhia de Eletricidade do Cariri) era Crato. Entretanto, os cratenses subestimaram o poder de organização da sociedade de Juazeiro do Norte, e as lideranças daquela cidade foram mais competentes levando a sede da Celca para lá. A festa comemorativa à chegada da energia gerada pela cachoeira de Paulo Afonso – que trouxe até o Ministro da Viação para a solenidade – foi toda feita em Juazeiro do Norte. De lá para cá a vizinha cidade só tem contabilizado vitórias quando disputa com Crato a localização de melhoramentos destinados à região.

    Ante essas adversidades citadas, José Horácio nunca perdeu a calma para justificar as dificuldades que enfrentou como prefeito de Crato. E continuou a agir com a mesma tranquilidade, com a mesma distinção pessoal, com sua postura pacífica e a serenidade que lhe era peculiar.

     Conta-se que durante seu governo, num ano de chuvas excessivas, até as ruas próximas ao centro de Crato enfrentaram a destruição do calçamento e o aparecimento de buracos. Um dia, num beco existente atrás da Catedral, um caminhão ficou atolado no lamaçal. Revoltado, o motorista do veículo começou a culpar – em voz alta e com duras expressões – o prefeito de Crato por aquela situação. Por coincidência, José Horácio ia passando no local. Ouviu tudo sem se alterar e só quando o motorista se calou, o prefeito falou:
– Invernão... não é meu amigo?

2 comentários:

  1. Postagem oportuna e muito importante para os admiradores de memoria e historia do Crato. Tenho dito sempre : os políticos se destroem quando se desentendem e brigam. A divisão causa sempre a derrota do outro. O Brasil atual é exemplo disso.

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  2. A história sustenta que José Horácio encontrava sempre uma solução bem humorada para os problemas que enfrentava.

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