Na origem do PT, no início da década dos 80 do século passado, há a convergência inédita de três segmentos da sociedade: sindicalistas da indústria automobilística, esquerda acadêmica e comunidades eclesiais de base, representando a ala progressista da Igreja Católica.
A articulação entre eles permitiu que o partido, mais que qualquer outro, antes ou depois, se enraizasse na sociedade, expandisse seus tentáculos e produzisse uma militância ativa e disciplinada, que nenhum outro até hoje logrou constituir.
O projeto de cada um desses segmentos era – e é – distinto. A uni-los, havia a luta comum contra a ditadura. Associaram-se à frente democrática, então comandada pelo PMDB de Ulysses Guimarães e Tancredo Neves, sem se permitir grande proximidade.
Derrubada a ditadura, mantiveram distância dos sucessivos governos, tornando-os alvo de críticas sistemáticas.
Passou a uni-los a questão social, cada qual focando-a a seu modo, sem conflitos que ameaçassem a convergência. Os sindicalistas tinham – e têm – visão utilitária, pragmática. Lutam por conquistas trabalhistas concretas, nos termos do sindicalismo de resultados, inicialmente criticado por Lula – e hoje marca das três centrais que dominam o setor.
Já a esquerda acadêmica e o clero progressista conferem tom ideológico à questão social, que compatibilizaram sem dificuldades com o discurso sindical. Lula mesmo já disse mais de uma vez que “nunca fui de esquerda; fui torneiro-mecânico”. Mas tem ciência de que a aliança de seu partido é pela esquerda.
Essa aliança manteve-se até aqui sem maiores conflitos. Eis, porém, que o 3º Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3) promove a primeira cisão grave – aparentemente incontornável – nesse pacto partidário. A Igreja Católica está desembarcando dele. Caminhou lado a lado com a esquerda acadêmica até que a agenda de ambos – humanismo x religião - entrou em conflito.
Enquanto os uniam causas institucionais (fim da ditadura) e questões sociais (capitalismo x socialismo), foi possível conciliá-las. Quando, porém, a agenda da esquerda passa a incluir questões comportamentais de vanguarda, que põem em xeque a moral cristã – aborto, casamento e adoção de crianças por casais gays, proibição de símbolos religiosos em locais públicos -, o convívio chegou ao limite.
O enunciado da ruptura foi dado na 48ª Assembléia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), esta semana, em Brasília. Os bispos deixaram de lado suas diferenças ideológicas – os progressistas, que compatibilizam cristianismo e marxismo, e os ortodoxos, que consideram os dois credos incompatíveis – e desancaram em uníssono o PNDH 3.
O governo já recuou em diversos pontos da questão: suprimiu a liberação do aborto, a proibição de símbolos religiosos, mas não as cláusulas que se referem aos gays, cujas conquistas foram alvo de foram condenação veemente por parte dos bispos, que reiteraram proibição a que ingressem na Igreja.
Como coroamento desse processo, a Assembléia produziu um manifesto em que recomenda aos fiéis que votem em "pessoas comprometidas com o respeito incondicional à vida, à família, à liberdade religiosa e à dignidade humana.
Embora o manifesto não faça menção explícita ao PNDH 3, o cardeal-arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer cuidou de fazê-lo, ao declarar que, naquele decreto, "além da descriminalização do aborto, há outras distorções inaceitáveis, como a união, dita casamento, de pessoas do mesmo sexo, a adoção de crianças por pessoas unidas por relação homoafetiva e a proibição de símbolos religiosos”.
Será possível desfazer o impasse e conciliar as agendas? Pior: será possível dissociar Dilma Roussef do PNDH? Na quarta-feira, em Porto Alegre, ela declarou que "estive presente em cada programa do governo". De fato, o PNDH foi concebido e executado na Casa Civil da Presidência da República.
Ruy Fabiano é jornalista.
A articulação entre eles permitiu que o partido, mais que qualquer outro, antes ou depois, se enraizasse na sociedade, expandisse seus tentáculos e produzisse uma militância ativa e disciplinada, que nenhum outro até hoje logrou constituir.
O projeto de cada um desses segmentos era – e é – distinto. A uni-los, havia a luta comum contra a ditadura. Associaram-se à frente democrática, então comandada pelo PMDB de Ulysses Guimarães e Tancredo Neves, sem se permitir grande proximidade.
Derrubada a ditadura, mantiveram distância dos sucessivos governos, tornando-os alvo de críticas sistemáticas.
Passou a uni-los a questão social, cada qual focando-a a seu modo, sem conflitos que ameaçassem a convergência. Os sindicalistas tinham – e têm – visão utilitária, pragmática. Lutam por conquistas trabalhistas concretas, nos termos do sindicalismo de resultados, inicialmente criticado por Lula – e hoje marca das três centrais que dominam o setor.
Já a esquerda acadêmica e o clero progressista conferem tom ideológico à questão social, que compatibilizaram sem dificuldades com o discurso sindical. Lula mesmo já disse mais de uma vez que “nunca fui de esquerda; fui torneiro-mecânico”. Mas tem ciência de que a aliança de seu partido é pela esquerda.
Essa aliança manteve-se até aqui sem maiores conflitos. Eis, porém, que o 3º Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH 3) promove a primeira cisão grave – aparentemente incontornável – nesse pacto partidário. A Igreja Católica está desembarcando dele. Caminhou lado a lado com a esquerda acadêmica até que a agenda de ambos – humanismo x religião - entrou em conflito.
Enquanto os uniam causas institucionais (fim da ditadura) e questões sociais (capitalismo x socialismo), foi possível conciliá-las. Quando, porém, a agenda da esquerda passa a incluir questões comportamentais de vanguarda, que põem em xeque a moral cristã – aborto, casamento e adoção de crianças por casais gays, proibição de símbolos religiosos em locais públicos -, o convívio chegou ao limite.
O enunciado da ruptura foi dado na 48ª Assembléia Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), esta semana, em Brasília. Os bispos deixaram de lado suas diferenças ideológicas – os progressistas, que compatibilizam cristianismo e marxismo, e os ortodoxos, que consideram os dois credos incompatíveis – e desancaram em uníssono o PNDH 3.
O governo já recuou em diversos pontos da questão: suprimiu a liberação do aborto, a proibição de símbolos religiosos, mas não as cláusulas que se referem aos gays, cujas conquistas foram alvo de foram condenação veemente por parte dos bispos, que reiteraram proibição a que ingressem na Igreja.
Como coroamento desse processo, a Assembléia produziu um manifesto em que recomenda aos fiéis que votem em "pessoas comprometidas com o respeito incondicional à vida, à família, à liberdade religiosa e à dignidade humana.
Embora o manifesto não faça menção explícita ao PNDH 3, o cardeal-arcebispo de São Paulo, dom Odilo Scherer cuidou de fazê-lo, ao declarar que, naquele decreto, "além da descriminalização do aborto, há outras distorções inaceitáveis, como a união, dita casamento, de pessoas do mesmo sexo, a adoção de crianças por pessoas unidas por relação homoafetiva e a proibição de símbolos religiosos”.
Será possível desfazer o impasse e conciliar as agendas? Pior: será possível dissociar Dilma Roussef do PNDH? Na quarta-feira, em Porto Alegre, ela declarou que "estive presente em cada programa do governo". De fato, o PNDH foi concebido e executado na Casa Civil da Presidência da República.
Ruy Fabiano é jornalista.
Com a proximidade do fim do governo é normal a debandada. Queria vê no inicio!
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