Páginas


"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


domingo, 9 de janeiro de 2011

MOMENTO DE PROSA

Professorinha
- Claude Bloc -

Sou professora desde que eu tinha 14 anos. Algo a estranhar? Pode ser, para as gerações mais novas que não conhecem e não sabem como era difícil, nessa época, se conseguir um professor que dominasse a Língua Francesa.

Quando comecei a dar aulas, eu tinha estado e na França por um ano - havia pouco tempo – e, estando lá, tinha estudado num colégio de freiras que eram amigas de minha avó Germaine, a quem eu carinhosamente chamava de Mamie Menotte. Isso me trouxe a experiência de conhecer a escrita do Francês e entender as “peripécias” da Língua no que tange às suas peculiaridades. Pois é, chegou o dia de enfrentar a primeira aula. No início, sem experiência tudo era difícil. Eu, professora, aos 14 anos, sozinha diante dos alunos, tentando captar a atenção deles... Bom, mas era uma tentativa. Madre Feitosa havia posto em minhas mãos um voto de confiança e eu teria que superar minha timidez e dar conta do recado.

Felizmente nessa época as salas de aula não pareciam, como hoje, um salão de festas com crianças barulhentas, parecendo “Gremlins” ou coisa assim. Não havia ninguém voando ou gritando pela sala, apenas vários pares de olhos me olhando esperando o desfecho daquele momento. Não posso dizer que foi esse o pior dia de minha vida, pois hoje sei o que pode ser bem pior, mas foi um passo difícil, pois tive que me superar, imitando meus mestres.

O fato é que acabei conquistando aquela turma e a pouca diferença de idade foi motivo de interação e não de afastamento. Eu e eles havíamos dado um passo à frente, todos aprendemos.

Hoje acredito ser muito importante na vida de um professor o momento em que ele vê que algo deu certo e com isso concluir que pode seguir adiante. Foi isso que fiz e nunca me esquecerei dessa lição e ao mesmo tempo de como trabalhar tão cedo foi útil e benfazejo para mim.

Nunca esquecerei igualmente de como, era nessa época, estar do outro lado da sala, sentada passivamente, como aluna, apenas bebendo da fonte. A simples menção do nome de algum professor mais austero já me provocava medo e fazia as cordas do meu coração darem um nó cego por dentro. Minha timidez era um verdadeiro fardo. Eu por exemplo, morria de medo de Alderico Damasceno. Não conseguia abrir a boca para falar palavra alguma perto dele. Se um dia eu tivesse tido a oportunidade de ter sido sabatinada por esse mestre acho que desabaria desmaiada aos pés dele. Ridículo, mas verdadeiro.

Daí porque decidi nunca agir com firmeza excessiva em relação aos meus alunos. Não quis adotar essa retaliação para não deixá-los exasperados. Creio que a idéia de nunca esquecer como é estar no lugar do aluno fez bem ao meu processo educativo. Mesmo diante de minha pouca experiência tirei minhas próprias conclusões. Aprendi com isso. Sem esquecer de como é gratificante ler o reconhecimento nos olhos de quem nos ouve.

Diante disso, concluí nesse processo, que todo professor não deve entrar em sala sem ter preparado sua aula. Essa é a regra primordial. O resto a gente aprende com o tempo, mas é sempre útil imaginar e supor como será a aula que preparamos e manter os pés no chão. Incentivar a aprender pelo prazer de aprender e não pela obrigação.

Enfim, posso dizer que embora nem tudo sejam flores, amo meu trabalho, sou apaixonada pela minha profissão. Dedico-me. E afirmo: continuo aprendendo, afinal tudo na vida é  um aprendizado. 

Claude Bloc

21 comentários:

  1. Claude,a tua profissão já nasce com o amor de mãe.Que belo.O título que vale é esse amor maternal que a professorinha traz dentro do seu coração.Um abraço.

    ResponderExcluir
  2. Vixe, Dihelson, obrigada...
    Recebeu meu e-mail?

    Responda, please.

    Abraço,

    Claude

    ResponderExcluir
  3. Dr. Rolim,

    Só tenho que agradecer pela sua compreensão em relação à dimensão do amor que a gente dedica a essa profissão.

    É algo mesmo tão forte quanto cuidar das crias, afinal alunos são um de certa forma filhos da gente.

    Abraço, Claude

    ResponderExcluir
  4. Claude, o sacerdócio da sala de aula é algo encantador e muitas vezes incompreendido...pouco valorizado, que pena! Parabens Grande Poeta e Grande Professora,

    Severo

    ResponderExcluir
  5. Prezada Claude.

    Com esta mesma idade eu fui contratado pela prefeitura de Varzea-Alegre para dar aulas num projeto denominado MOBRAL no grupo do Inharé. No turno da noite, 30 alunos com idade de 50, 60 e as vezes 70 anos, todos analfabetos. Não tive a honra de ensinar Frances, a mais bela das linguas, mas carrego a graça de ter ensinado aquelas pessoas a porem o nome em um documento de identificação e se tornarem cidadãos. Parabens Claude.

    ResponderExcluir
  6. Claude.
    Você nesta foto, já expressa a determinação de educadora. E os seus olhos já buscam no mundo a inspiração, para o que seria mais tarde, seus belos poemas.
    Abraço de Jatí.
    Mundim.

    ResponderExcluir
  7. Engraçado, Claude, temos histórias parecidas. Comecei a ensinar com 15anos dando áula de reforço em casa quando não podia caminhar ainda na pacata Várzea Alegre. Decidi fazer o curso de datilografia e me apaixonei pela digitação, não demorou muito para ser instrutora de dactilografia também. Nessa época já comecei a conviver com jovens. Depois vim para Fortaleza fazer a cirurgia que me fez caminhar milagrosamnente. Fiz Faculdade de Letras, fui monitora de Latim, Português e Francês. Estudei tanto, batalhei tanto que quando colei grau já estava me preparando para assumir o primeiro emprego. Costumo dizer que aprendi muito em sala de áula. Foi no Centro de Línguas - IMPARH que encontrei a clientela que eu realmente precisava para praticar meu francês. Pessoas que buscavam o aprendizado do idioma mais suave desse mundo. Preparei muita gente para o mercado de trabalho nos aeroportos, hotéis,Instrumental (para quem desejava prestar concursos, mestrado ou doutorado). Bom, não posso dizer que era a professorinha como você mas tenho idéia da dimensão do amor que a gente dedica a essas pessoas maravilhosas que a gente encontra de vez em quando e nos enchem de elogios.Ah! Uma sugestão: vamos continuar com esse dedo de prosa bem despretensioso aqui no blog? Le sort en est jeté.
    Parabéns pela bela postagem,
    Fafá

    ResponderExcluir
  8. Morais, eu não tive o privilégio de ensinar no MOBRAL, mas tive uma experiência ímpar na minha vida: quando minha irmã adoeceu de ALZHEIMER contratamos uma cuidadora que não sabia ler ainda. Usei o método PAULO FREIRE e hoje me orgulho muito dela que já estuda no PROJOVEM. Coincidentemente, uma de suas professoras naquela entidade foi minha aluna de Francês. Tudo isso me emociona muito e me faz entender qwue tenho uma forte missão de educar, cuidar e acompanhar.Abraço Fafá

    ResponderExcluir
  9. Raimundim, você sabe quem me deu embasamento para ser o que sou hoje, não sabe?

    ResponderExcluir
  10. É, Rolim, a gente acaba sendo um pouco mãe, muitos deles hoje ainda me visitam, telefonam. Sou amiga de meus alunos, sabia?
    Fafá

    ResponderExcluir
  11. Dielson, me emociono demais cada vez que escuto "SOUS LE CIEL DE PARIS". Quando eu ia tomar meu café da manhã em frente á FENAC, havia um acordeonista que tocava sempre, depois eu ia pegar o metrô no caminho da escola e lá então noos corredores o som se fazia mais mágico ainda. Gostava também dos artistas do BEAUBOURG.Haja magia e glamour. Abraço,
    Fafá

    ResponderExcluir
  12. Faf'a,felizes daqueles que foram teus alunos.Uma inveja rodeia o meu íntimo.Abraco.

    ResponderExcluir
  13. Ainda é tempo, Rolim, embora saiba que sua profissão toma muito seu tempo, estou aposentada mas dou áula particular e faço tradução ainda.

    ResponderExcluir
  14. Morais,

    Creio que na nossa época as coisas eram mais simples e os compromissos precoces, faziam de nós pessoas melhores.

    Aprendi muito com tudo o que tive que fazer nesse tempo. Depois desse início como professora, logo fui chamada por Dr. José Newton Alves de Sousa para dar aulas no D. Bosco, Silmia Sobreira me chamou para dar aulas na Aliança Francesa, Monsenhor me chamou para dar aulas no Diocesano... Se eu não tivesse tido garra, vencendo minhas limitações, não teria tido a chance de trabalhar tão cedo reforçando minha capacidade de fazer trocas, crescendo junto com minha clientela de alunos (*trocas de conhecimento).

    Hoje somos o que fizemos de nós (nessa longa estrada)... Acontecemos (risos)

    Abraço,

    Claude

    ResponderExcluir
  15. Claude, recebi seu e-mail e já respondi. Você leu ?

    Abraços,

    DM

    ResponderExcluir
  16. Obrigada, M. Severo,

    Nunca se viu um professor rico pelo que ganha, mas sempre se viu professores ricos em amor e dedicação...
    Nessa última fatia me encaixo.
    Quando somos talhados para abraçar uma profissão, creio que desde cedo despertamos para esse caminho.

    Eu, já adolescente tinha no meu quarto um "internato" de bonecas. As vizinhas deixavam lá suas "filhas" e eu confeccionava as "fardas", os cadernos, lençóis, travesseiros... tudo bonitinho. Depois encenava-se a aula.

    Acho que isto está no sangue. Ninguém escapa.

    Obrigada pela presença. Visite também o Cariricaturas.

    Abraço,

    Claude

    ResponderExcluir
  17. Dihelson,

    Li e vou responder...

    Obrigada

    Abraço,

    Claude

    ResponderExcluir
  18. Mundim,

    Seu comentário foi tão amigo e tão sincero que me emocionou.

    Sua capacidade de observação foi aguda, mas também poética. Acho que você não pode fugir disso: você é poeta! Tem esse dom entranhado dentro de si.

    Obrigada, obrigada,

    Abraço,

    Claude

    ResponderExcluir
  19. Fafá,

    Só agora tive acesso à internet numa chuvosa e alagada Fortaleza.

    Menina, Fafá, você é um exemplo de vida, uma lutadora, uma vencedora. Quanto mais eu conheço de você, mais a admiro e aos poucos vou me identificando com seus gostos, sua luta e seu sucesso.

    A você quero dizer que muito me alegra incluí-la por entre as minhas diletas amizades.

    Um abraço amigo.

    Obrigada por tudo, e pela sincera manifestação de amizade e de apoio. Serei eternamente grata.

    Claude

    ResponderExcluir
  20. Claude,

    A arte de ensinar é uma dádiva - o resto é técnica. O amor pela profissão é um presente de Deus, recebido, não pelos mestres, mas pelos gestores da educação, que tão mal os remuneram.

    Parabéns à professorinha, à professora e a todos os seus alunos.

    Um abraço.

    ResponderExcluir