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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


sábado, 21 de abril de 2012

O QUE É BOM TÁ GUARDADO - Por Mundim do Vale

Era mês de junho, tempo de colheta de arroz, o arroz da roça de Zé de Pedro André, tava todo maduro já a ponto de virar os cachos de tão cheios que estavam. Aquele cenário para nós da terra do arroz, era o quadro mais perfeito das obras de Deus.

Zé André promoveu um adjunto na colheta e para tanto, convidou muitos amigos como, os Joaquins, os Lobos os Zezins e muitos parentes. Convidou também o grupo de Maneiro Pau, a banda de pífano, cortador de tesouras e penitentes.

Entre os convidados estava o grande poeta das Bravas Zé Bilica.

Previnido como era, Zé André abasteceu toda a dispensa para evitar a surpresa do “ Bater o prato “ Ainda por segurança sacrificou o carneiro do seu filho Antônio Morais, que tinha sido um presente.

Depois do arroz colhido, veio as brincadeiras e o extravío de alimentos feito pelos amigos na tentativa de “ Bater o Prato “ Fato esse que não aconteceu.

Se alguém tivesse pedido para o poeta Zé Bilica improvisar uma décima sobre aquele acontecimento, ele teria feito assim:


Na festa de Zé André

Da apanha do arroz,

Não faltou baião de dois

Nem caba bom na quicé.

Oliveira mais Tindé

Fizero um pote medõe

E Seu zé André risõe

Adimirando a fartura.

Cumêro inté a fussura

Do carneiro de Ontõe.

Na hora da despidida, o poeta Zé Bilica convidou Zé André, para uma vaquejada que ele faria no mês de setembro seguinte. Zé André firmou o compromisso e quando foi na data marcada seu filho Antônio veio a Várzea Alegre e de lá fioram as Bravas.

Chegando nas Bravas, já foram vendo a poeira feita pelos animais, em seguida viram numa latada um forró com o sanfoneiro desafinado, os cavalheiros embriagados e as damas com saias curtas e as blusas decotadas.

Zé André que tinha um comportamento arredío para aquelas coisas Perguntou para Antõnio:

- Meu filho. Essa meninas dançam só de cinto?

Só isto bastava para deixar Zé André constrangido, mas como se não bastasse ainda tinha a agravante de já ser duas horas da tarde e ninguém ter notícia de comida. O convidado que tinha costume de almoçar às nove horas e jantar às 03:00 horas da tarde, já estava pálido de fome e com gastura do cheiro de óleo de coco, que vinha dos cabelos das damas.

Uma certa hora lá Zé escutou a vocalista cantar:

O que é bom tá guardado,

O que é bom tá guardado.

Mas só dou a Chico Véi,

Porque é meu namorado!

Zé André pegou na mão do filho e falou:

- Vamos meu filho. Que o que tá guardado, não é pra nós não.

Se alguém tivesse pedido para o poeta Zé Bilica fazer uma décima da despidida de Zé André, teria saído mais o menos assim:

Seu Zé não faça fiura

Cum nosso povo das Brava,

Tem doze quilo de fava

Cunzinhando na frivura.

Vem quarenta rapadura

Do ingém de João Bilé

E um Magote de muié

Lá do Riacho do Mei.

Ispere. Num faça fei,

Ispere. Seu Zé André.

Dedicado para os familiares do saudoso José de Pedro André e para O poeta das Bravas Zé Bilica.


3 comentários:

  1. Prezado Mundim do Vale.

    O seu relato está fiel a realidade da história. Obrigado pela dedicação.

    José André costumava almoçar entre nove e dez horas e, neste dia se chegou as duas horas da tarde e não se falou em comida.

    Na verdade as festas tinham sentidos diferentes. O adjunto era muito diferente: trabalho, colheita, fartura de comida. Na vaquejada festa para jovens: musica, bebida, diversão.

    Parece que estou vendo o meu saudoso pai dizendo: meu filho, vamos "simbora" que o que é bom tá guardado mas não é pra nós.

    Obrigado Mundim.

    Grande Abraço dos André.

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  2. BELLA DISSERTAÇÃO MESMO QUE SENDO EM MODO IMAGINÁRIO ; MAS DE UM EXCELENTE CONTEÚDO. E COMO FALOU MORAIS FIDEDIGNO COM A REALIDADE DA ÉPOCA

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  3. Vejam que maravilha!: não é José André?
    Abraço fraterno. Fatima.

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