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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


terça-feira, 18 de novembro de 2014

Ao diabo não se diz amém - Mary Zaidan.


A proposta de flexibilizar a meta fiscal enviada ao Congresso Nacional é obscena sob qualquer ótica.

Não é a primeira e por certo não será a última vez que o governo Dilma Rousseff transfere para outros a tarefa de corrigir os males provocados por um dever de casa que ela não fez. Mas nunca antes da história deste país um governo foi tão longe: quer aprovar uma lei para descumprir a lei.  

A proposta de flexibilizar a meta fiscal enviada ao Congresso Nacional é obscena sob qualquer ótica. 

Dilma gastou muito mais do que arrecadou por meses a fio. Passou a campanha eleitoral inteira mentindo que a economia ia bem, tratando qualquer crítica como mau-agouro de gente que torce pelo quanto pior, melhor.

A menos de dois meses do fim do ano, a recém-reeleita se vê forçada a confessar que não tem saldo para fechar as contas. Sugere mudar as regras do jogo pertinho do apito final, exigindo que o Congresso limpe a sua lambança.

Mais: pede arrego com a marca registrada da arrogância.

Nem Dilma nem os seus admitem qualquer erro na condução da política econômica. Ao contrário. Publicamente, ela faz pouco caso do tema: “Dos 20 países do G-20, 17 estão hoje numa situação de ter déficit fiscal”, disse em Catar, antes de seguir para a Austrália para o encontro dos 20 ricos que ela afirma estarem mais debilitados do que o Brasil.

Se assim fosse, por que então inventar uma lei de última hora para pintar de azul o vermelhão das contas públicas?

Na sexta-feira, em entrevista à jornalista Míriam Leitão, o ministro da Casa Civil, Aloízio Mercadante, ultrapassou todos os limites. Arguido sobre a hipótese de rejeição da proposta, ele, sem qualquer constrangimento, transferiu a conta da irresponsabilidade governamental: “Se o Congresso não der autorização nós cumpriremos o superávit. É simples. Suspende as desonerações, corta os investimentos para as obras e para uma parte da economia. Nós vamos ter mais desemprego e ficará na responsabilidade de quem tiver essa atitude.”

Falou isso de cara limpa, como se ao invés de estagnação e PIB menor de 0,5%, o país estivesse crescendo horrores graças à indução das políticas públicas.

À obscenidade agregam-se à lei outros atributos da mesma estirpe. Se aprovada, não servirá a quem interessa, já que credores e investidores sabem que o anil do balanço é falso. Mas, de forma perversa, derrubará o instituto da responsabilidade fiscal também nos estados e municípios. Se a União pode, por que não os demais? Um desastre anunciado.

Ainda que a manobra arisca dos aliados para acelerar a votação indique a possível aprovação do projeto, o Congresso Nacional tem uma chance única de evitar a catástrofe. De mostrar que não se ajoelha para quem faz o diabo.

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