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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


sábado, 11 de maio de 2019

Brasília opera como se desejasse acordar a rua - Josias de Souza


A roubalheira não atingiu o estágio epidêmico no Brasil por acaso. A oligarquia política e empresarial tornou-se corrupta porque a corrupção tem defensores poderosos no país. Feridos, os paladinos da imoralidade estavam recolhidos. Jogavam com o tempo. Festejaram em silêncio a volta das ruas para casa. E passaram a sonhar com a chegada do momento em que a Lava Jato se tornaria um assunto chato.

A julgar pelo rebuliço que se observa em Brasília, o grande dia chegou. Os cavaleiros da velha ordem estão de volta. Movem-se com desenvoltura incomum. É como se planejassem tirar o atraso. Já nem se preocupam em maneirar. Perderam o recato. Há poucos, muito poucos, pouquíssimos inocentes em cena. Juntos, culpados e cúmplices compõem a maioria.

Na comissão especial que se incumbiu de examinar a medida provisória 870, que remodelou os ministérios ao gosto de Jair Bolsonaro, o esforço anticorrupção recebeu duas pauladas. Primeiro, deslocou-se o Coaf da Justiça para a Economia. Poder-se-ia alegar que a volta atrás seria tecnicamente justificável. Mas a segunda cacetada deixou evidente o que se passava na comissão.

Aprovou-se uma emenda-jabuti que restringe a atuação dos auditores da Receita Federal, afastando-os do Ministério Público. A turma do Fisco terá de se ater aos crimes tributários. Se esbarrarem em indícios de corrupção, lavagem de dinheiro e toda sorte de delitos, não poderão se reportar diretamente ao Ministério Público, como fazem hoje. O compartilhamento dos dados só será admitido mediante autorização judicial.

Ah, que maravilha! A corrupção passa pelo portão dos fundos, sobe pelo elevador privativo, encontra a porta aberta e entra sem bater. A fiscalização marca hora e toma chá de cadeira na antessala. Esbarrando em algum crime, fica de bico calado, redige um requerimento à chefia, que envia um ofício ao Departamento Jurídico, que protocola uma petição ao juiz, que produz um despacho qualquer quando bem entender.

O secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, chamou a manobra pelo nome próprio numa postagem no Twitter: "Mordaça", ele anotou. "É incrível uma lei proibir um auditor fiscal de comunicar ao Ministério Público a suspeita de um crime, conexo ou não a um crime tributário investigado. Isso é uma obrigação de qualquer cidadão. Uma mordaça está sendo colocada na Receita Federal…"

Um comentário:

  1. Com o amparo de autoridades, a certeza da impunidade o crime vai navegando de pai para filho. Um conluio sem vergonha. É um filho enrolado com um pai também enrolado legislando em causa própria. É um genro enrolado com um sogro enrolado fazendo o mesmo. E o povo, a causa de tudo, defendo um ou outro.

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