Num instante em que Renan Calheiros, estalando de pureza moral, executava o seu número de combate aos abusos cometidos por autoridades como magistrados, procuradores e delegados, a ministra Cármen Lúcia invadiu-lhe o palco. Tirou-o para dançar.
Ao abrir a primeira sessão de debate sobre o projeto que atualiza a Lei de Abuso de Autoridade, de 1965, Renan deu uma lição de óbvio à plateia. Ensinou que a arbitrariedade “é uma chaga incompatível com o regime democrático de proteção às liberdades civis.” Renan marcou para 1º de dezembro nova rodada de discussão.
Horas depois da aula do professor Renan, a presidente do Supremo Tribunal Federal marcou a data do julgamento de uma denúncia contra o senador. Nela, a Procuradoria-Geral da República acusa o presidente do Senado de custear com propinas recebidas da Mendes Júnior as despesas de uma filha que teve fora do casamento.
Cármen Lúcia marcou para o mesmo dia 1º de dezembro a sessão em que os ministros do Supremo devem abrir ação penal contra Renan, convertendo-o, finalmente, em réu. Se lhe perguntarem, a ministra será capaz de jurar que a coincidência de datas foi obra do acaso.
Seja como for, ficou entendido o seguinte: Renan Calheiros no papel de ombudsman de autoridades que ultrapassam os limites da lei é algo tão inusitado quanto um macaco na gerência da casa de louças.
No mesmo dia em que receberá no Senado os doutores Sergio Moro e Gilmar Mendes, estrelas da última sessão de debates sobre abuso de autoridades, Renan, protagonistas de 12 inquéritos, será retratado no plenário do Supremo como um abusador da paciência alheia. A Procuradoria acusou-o de três crimes: falsidade ideológica, uso de documento falso e peculato.
Renan marcou para 6 de dezembro a votação do projeto sobre abuso de autoridades. Nesse dia, o senador já estará desfilando pelo tapete azul do Senado sua condição de réu. Isso, naturalmente, se o ministro Dias Toffoli não jogar sobre a mesa mais um desses pedidos de vista que desvirtuam o acaso que rege os passos da dança de Cármen Lúcia.
A denuncia não é nada nobre. Já foi motivo de renuncia da Presidência do Senado em outras eras. Ter uma filha fora do casamento e por cima uma empreiteira pagar a mesada, só o povo brasileira e alagoano merecem uma desmoralização dessas.
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