O País vive dias politicamente agitados. Mas para quem imaginava que
uma segunda condenação de Lula levantaria as massas em protesto, o
pós-julgamento, independentemente de se estar ou não de acordo com o
veredicto, foi decepcionante. Na verdade, a maioria da população
continuou imersa no dia a dia. A fagulha que viria dos “movimentos
populares” não veio. O que não quer dizer que no transcorrer do tempo,
por outras razões e pelas consequências da eventual prisão de Lula, o
ânimo das pessoas não possa levá-las às ruas.
Nada disso muda o
panorama: a movimentação confina-se aos meios políticos e jornalísticos e
ao mercado financeiro. A eventualidade de quem estava à frente das
preferências ser impedido de concorrer por uma lei que, ironicamente,
ele próprio sancionou, chamada “da Ficha Limpa”, produz certo alvoroço
para saber como se distribuirão seus votos. E assim será a cada nova
pesquisa eleitoral que apareça. As eleições, entretanto, virão. O
calendário não será alterado. Os partidos e candidatos, todos eles,
passado o alvoroço, procurarão adaptar-se à realidade.
É cedo
para prognósticos. Quando deixei o Ministério da Fazenda para ser
candidato (em outras circunstâncias, é verdade), tinha 12% das intenções
de voto e Lula, três vezes mais. Em julho, depois de o real virar
moeda, a tendência começou a mudar, mas a mudança só se tornou nítida
quando teve início o horário eleitoral na TV e no rádio, atraindo parte
importante da atenção da maioria das pessoas. Os eleitores olharam os
candidatos e optaram por quem lhes pareceu mais capaz de conduzi-los a
um futuro melhor.
Naquela época a questão central era o controle
da inflação. Hoje não há uma, mas várias questões centrais. Além disso, a
mídia social, a da internet, abre maiores espaços para todos os
candidatos.
Política é circunstância, mas é também esperança, e
esta depende de o candidato encarnar uma mensagem consistente com o que a
maioria do eleitorado sente e deseja. Hoje o tema central não é mais a
inflação. O desemprego – e, portanto, o crescimento da economia –, o
crime e a insegurança das pessoas, bem como a corrupção, que provoca o
clamor por decência, são os novos pontos sensíveis.
A vitória
eleitoral depende de se construir e saber transmitir uma mensagem que
toque a sensibilidade popular e dê resposta às principais preocupações
da maioria da população. O eleitorado avalia a seu modo as
possibilidades de dias melhores que o candidato lhe oferece. Essa
avaliação, a rigor, ainda não se iniciou. A grande maioria das pessoas
só começará a fazê-la bem mais à frente.
Na escolha do candidato,
a economia conta, mas não os dados puros e duros. Os americanos falam
do feel good factor, ou seja, do sentimento de bem-estar. Não basta que
os dados mostrem aos especialistas que a economia está melhorando, é
preciso que as pessoas sintam que a vida melhorou para si e para os mais
próximos.
O discurso “técnico” ajuda pouco a obter votos. Dados
sem alma são como pedras que rolam dos morros, não formam caminhos. É
preciso oferecer bons motivos para que a escolha do eleitorado recaia
sobre A e não sobre B. Daí que sejam importantes a campanha, a mensagem,
a capacidade do candidato de ter uma fala coerente com sua trajetória.
Antes dos embates reais entre os candidatos, as apostas são arriscadas.
Está na moda, dada a dispersão de preferências de votos, imaginar
possível repetir o “fenômeno Macron”. Sim, podem-se despertar esperanças
e juntar segmentos de uma sociedade fragmentada e desiludida com os
políticos. Mas as circunstâncias aqui são outras.
Na França a
eleição presidencial é solitária e candidatos independentes podem
concorrer. As eleições para a Assembleia Nacional se dão um mês depois, o
que dá ao presidente vitorioso, mesmo um outsider, enorme chance de
“formar a maioria”. No Brasil só podem concorrer candidatos filiados a
partidos. As alianças partidárias para a eleição são importantes para
assegurar tempo de TV e recursos de financiamento de campanha. Depois de
eleito, porém, o presidente não terá a maioria congressual assegurada,
dada a fragmentação do sistema partidário.
Só a partir de abril,
quando termina o prazo para a filiação a partidos, pré-requisito para
disputar a eleição, poderemos ver se haverá mesmo outsiders. Até as
convenções partidárias, que se devem realizar entre julho e início de
agosto, o jogo político se concentrará na montagem das alianças
partidárias para a Presidência, os governos estaduais e o Congresso, um
quebra-cabeças em três camadas que se afetam reciprocamente. Por mais
importante que seja montá-lo, quem queira vencer a eleição presidencial
não se pode descuidar da construção da sua narrativa, desde já.
A
dispersão do eleitorado mostra que entre nós os “partidos” não são
condutores do voto, com as exceções conhecidas. Os líderes contam mais
do que eles. Essa é uma das fragilidades da nossa democracia. Com a
desmoralização da “classe política”, se houver alguém capaz de comover
as massas e de significar para elas um futuro melhor, pode ganhar. Nesse
caso, como governará? Com quem e a que custo?
Desmoralizados ou
não, fragmentados ou não, mesmo em crise, como estão, os partidos são
instrumentos básicos nas democracias representativas. Sua substituição
pela mensagem do líder é possível, mas, em geral, as consequências são
negativas. Melhor tratar de reinventar os partidos e abrir espaços para
que as pessoas opinem e participem das decisões do que imaginar que
“alguém” salvará a Pátria. A Pátria precisa tanto de líderes como de
instituições. E, principalmente, de um eleitorado que leve ao poder quem
tenha visão de País e do mundo e, sustentando os valores da decência e
da democracia, possa oferecer maior bem-estar ao povo.
(*) Fernando Henrique Cardoso. Sociólogo, foi presidente da República
Prezado Armando - Pouca gente sabe que Fernando Henrique é pai de um senhor casado com uma filha de um Magalhães Pinto das Minas Gerais, dono do Banco Nacional, o Banco do Guarda-Chuva. Quando o governo Itamar liquidou o Banco Econômico do Ângelo Calmon de Sá, amigo do ACM, havia a certeza que o Banco Nacional estava em mesma situação e não teria sido liquidado por proteção do FHC , ministro da fazenda do Itamar. ACM ameaçou usar esse fato para chantagear o Itamar. Resultado da história o Banco do filho do ministro FHC foi liquidado. FHC não é a pessoa indicada para falar de honestidade. Itamar sim.
ResponderExcluir