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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


quarta-feira, 28 de março de 2018

Vale a pena ver "O Mecanismo" -- por Elio Gaspari (*)

O seriado disponibilizado pela Netflix conta a história da Operação Lava Jato
    É bom negócio ver “O Mecanismo”, a série de José Padilha na Netflix. Seus oito episódios contam a história da Lava Jato até as vésperas da prisão de Marcelo Odebrecht. Eles giram em torno de dois eixos. 

    O primeiro é uma novela padrão onde há sexo, traições, doenças, rivalidades, muitos palavrões e até mesmo uma menina com deficiência. A quem interessar possa: o agente Ruffo nunca existiu. Pena que ele seja um narrador do tipo “faço sua cabeça”, numa espécie de reencarnação do Capitão Nascimento de “Tropa de elite”. A agente Verena é uma exagerada composição.
   É a segunda história, a da Operação da Lava Jato, que valoriza a série. E é ela que vem provocando a barulheira contra Padilha. A ex-presidente Dilma Rousseff (Janete Ruskov na tela) acusa “O Mecanismo” de duas fraudes. 

    Jogaram para dentro do consulado petista a operação abafa que decapitou as investigações das lavagens de dinheiro do caso Banestado, ocorrido durante o governo de Fernando Henrique Cardoso. (Há uma referência a “dez anos depois”, mas ela ficou embaralhada.) Noutro lance, puseram na boca de Lula (Higino, igualzinho ao original, graças ao ator Arthur Kohl) a frase “é preciso estancar a sangria”, do senador Romero Jucá. Também não há prova de que  “Higino” tenha pedido a “Janete” para trocar a direção da “Polícia Federativa”. 

     A narrativa do caso será útil para muita gente que perdeu o fio da meada da Lava Jato. Essa é a razão pela qual é melhor ver a série do que não vê-la. A Lava Jato fez um memorável serviço de faxina e hoje parece banalizada, o que é uma pena. O câncer de que fala o agente Ruffo estava lá e ainda está. Entrou areia no mecanismo das empreiteiras, mas ele funciona em outras bocas. 

      Num primeiro momento, Padilha explicou-se: “O Mecanismo” é uma obra-comentário, na abertura de cada capítulo está escrito que os fatos estão  dramatizados. Se a Dilma soubesse ler, não estaríamos com esse problema”. 

      Seja lá o que for uma “obra-comentário”, Dilma sabe ler, e essa explicação tem o valor de um balanço de empreiteira. Seria como se o diretor Joe Wright, de “O Destino de Uma Nação”, atribuísse a trapaça que fez com Lord Halifax a uma licença cinematográfica. Num comentário posterior, Padilha disse que expôs a corrupção do PT e do MDB. É verdade, pois o vice de Dilma chama-se “Themes” e foi posto no jogo. O tucano Aécio Neves também está no mecanismo: “Se o ‘Lúcio’ vence a eleição, breca isso na hora”. O procurador-geral Rodrigo Janot ficou por um fio. Padilha pegou pesado ao mostrar os pés dos ministros do Supremo entrando numa sessão enquanto Ruffo fala nas “ratazanas velhas” de Brasília. A dança dos presos comemorando uma decisão do STF também foi forte, mas, como se viu há pouco, o Supremo decide, e réus festejam. 

       Padilha bateu num caso histórico. A série é dele e fez o que bem entendeu, mas a trama novelesca e as catilinárias de “Ruffo” tiraram-no de outro caminho, o de uma série e de um filme recentes. “The Crown” é factualmente impecável e mexeu com os mecanismos da Casa de Windsor. “A guerra secreta” não precisou demonizar Richard Nixon para contar a história da briga do “Washington Post” pela publicação dos “Papéis do Pentágono”. Nos dois casos, não houve novela paralela, pois o recurso não era necessário.

(*) Elio Gaspari opiniao@opovo.com.br Jornalista

2 comentários:

  1. Não é nenhuma surpresa. O Pajé compôs um STF com gente da pior índole e caráter, conseguiu encontrar gente pior do que ele. Então, não se pode esperar nada justo e honrado da justiça. Todo trabalho de instâncias inferiores será em vão.

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  2. o jornalista José Roberto Guzzo diz que uma das maiores aberrações do Brasil é o "Foro Privilegiado". Ou seja a "imunidade parlamentar".
    E acrescenta o jornalista:
    "Os "constitucionalistas" falam em independência de poderes, garantias para a liberdade política,segurança para a democracia etc. Não é nada disso. É pura safadeza enfiada na constituição por escroques,de caso pensado, para proteger a si próprio do Código Penal".

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