Seu Almir era um homem bom, só fazia o bem e nunca acreditou em Deus. Fazia uma exigência, metódico que era: quando morresse, que seu cortejo fúnebre desviasse pela rua de trás, evitando passar em frente à Igreja de Nossa Senhora da Penha. Fez até um mapa detalhando o roteiro a ser cumprido.
Estava tudo preparado para esse dia, por ele mesmo, desde a bandeira do Flamengo a ser colocada sobre o caixão até o discurso de despedida, por ele próprio redigido e que seria lido por Altamiro, seu amigo, aposentado do BB e flamenguista como ele.
Proibido estava que se fizesse qualquer oração, sequer um Pai-Nosso. Altamiro foi-se antes, coração atropelado por um enfarte desgovernado e sem freios.
Seu Almir morreu num domingo, na hora da missa das sete e seu sepultamento foi às quatro da tarde, quando se iniciava a novena em louvor à Virgem Maria.
A rua estava lotada de fiéis e seus amigos o acompanharam da Pedro II até o cemitério pela rua que fica por trás da Igreja. Se houve reza, foi baixinho e ninguém ouviu. Mais tarde, o Flamengo ganhou do Vasco por 1x0.
Da arquibancada do céu ouviu-se um grito de gol embrulhado num manto rubro-negro.
Seu Almir Carvalho, amigo leal, sincero e bom. Deixou muita saudade. valeu Xico Bizerra.
ResponderExcluirdaí porque o grito que se ouviu do céu saiu da boca dele, embora ele não acreditasse no céu.
ResponderExcluirA JANELA DA CASA DA FRENTE – do outro lado da rua
ResponderExcluirPor XICO BIZERRA
Estava tão perto, bastava atravessar a rua, no caso, a Avenida Teodorico Teles, onde morava Padim Zuza, meu avô. Do outro lado, ela e seu sorriso, à mesma distância, claro. A vontade de ir até àquela janela do outro lado só era menor que a timidez que impedia seu atravessar. Coisa de adolescente. Sempre, à mesma hora, o ritual repetido: debruçar-se à janela, aprumar a vista para a janela da casa de frente, sonhar. Sabia que ela tinha o mesmo desejo e a mesma timidez, por isso, o mesmo ritual. Era a melhor parte das férias. Numa tarde de um junho quase julho passaram pela rua que os separava quase 30 fuscas, duas freiras e uma carroça carregando móveis usados, puxada por um cavalo castanho. Seu irmão menor viu e contou. Ele mesmo nada percebera além do debruçamento da menina à sua frente. Apenas praquela janela tinha olhos. Nas férias seguintes, a casa da janela enfeitada foi alugada a outra família. Foi a pior parte das férias. Numa tarde, ele contou 41 fuscas passando pela rua, a maioria deles branco. Duas freiras voltaram a passar. À tardinha, bem lentamente, passou uma carroça de saudades puxada por um cavalo azul.
morais,
ResponderExcluirinfelizmente meu 'analfabetismo tecmnológico' só me permite enviar escritos através de comentários em posts anteriores. Que fazer?
Farei Xico. E estarei enviando o convite para postagem direta no Blog. Será um grande prazer contar com voce. Voce sabe que é um do Sanharol? Dos bons. Mesmo da gema! Via Vicente Alves Bezerra, Zuza Bizerra ETC.
ResponderExcluirAbraços.
Xico, estou aguardando resposta de um e-mail que enviei para Dulce. Empresta teu PC para ela me responder (risos). Enviei agorinha um recado para ela via orkut.
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