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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


quinta-feira, 7 de julho de 2011

Coisas nossas - Por Zé Nilton



Por onde andarão?
(Dalmir em primeiro plano)

Para Vicente Almeida, um destemido pequeno-grande homem.

Coisas bem nossas lembrar-se de tempos e pessoas que povoaram nosso universo, e deixaram marcas profundas feito ondas, vagueando ao léu do tempo dentro de nós, e captadas a qualquer momento, quando nos lembramos de felicidade. Bom demais.

Três rapazinhos varzealegrenses conheci-os, numa fase difícil de nossas vidas, quando por aqui tudo era muito desolado. Costumava olhar ao longo da Rua João Pessoa, e contar nos dedos quantos transeuntes, carroças, carros e bicicletas circulavam, morosamente, pela rua grande, ainda sombreada por benjamins de copa redonda. De tempos em tempos a rua era sacudida, por ocasião dos “queimas” das lojas Romcy e Asteca. Seu Almir, de um lado da rua, e o grande Modesto Tavares, do outro, atraiam pessoas que vinham para este fim, por que calendarizado no ciclo de festividades da cidade.

Francisco Dalmir de Freitas, Darlan e o menino Demontieu. Três irmãos, três amigos dos tempos das vacas magras.

Corria o ano de 1968 quando nos conhecemos. Primeiro Dalmir, depois Demontieu. Estivemos os dois por alguns anos no mesmo local de trabalho. Dalmir, muito romântico, sonhador e louco por música; Demontieu, circunspecto, caladão e sempre preocupado com a vida, apesar de seus 14 anos.

Por questões de idade e de estado d´alma tornei-me mais afeiçoado a Dalmir. Invejava sua caligrafia, sua tranqüilidade e sua beleza. Sua presença enchia-nos de alegria, ao tempo em que nos esquecíamos de nossas agruras, agudizadas pelos baixos salários e pela falta de perspectiva.

Muito esticada ainda era a linha divisória do rural e do urbano. De um lado e do outro as marcas da riqueza e da pobreza eram perversamente expostas. Em cada esquina homens, mulheres e crianças tinham nome - esmoler.

Dos entornos da cidade os doidos apareciam para fazer morrer de rir o “hitch society” da época formada de abastados comerciantes, decadentes agropecuaristas e promissores servidores públicos.

Mas, voltemos a Dalmir.

Nossas almas se cruzavam à medida que nos descobríamos reciprocamente. Logo notei nele um estro gracioso e uma inclinação para a arte da música, mercê de sua afinação e ritmo. Tinha mesmo uma queda para a música e para cantar. Só não tinha jeito para tocar instrumentos. Ainda tentei.

Certa vez, num domingo, olhando na televisão que ficava na parte de exposição das Lojas Stuart, na Siqueira Campos, vidrei no quarteto MPB4. Miltinho, Magro, Aquiles e Ruy, num uníssono, interpretavam “Derramaro o Gás”, de Luiz Gonzaga e Zé Dantas. Fui atraído por aquela idéia de ecletismo musical, e nunca mais o deixei.

Não deu outra, num dado fim de semana, lá estávamos nós: eu, Dalmir, e dois outros que não me lembro, usando os mesmos instrumentos do famoso quarteto: violão, bongô, tambô, triângulo e voz, se metendo a imitar logo quem... o MPB4, pode ?

Tiramos algumas músicas, mas o fracasso se deu pela desafinação das vozes. Não se junta pessoas para cantar de uma hora para outra. O canto exige técnica, e bota técnica nisso.

Terminamos mesmo embalando as músicas de iê, iê, iê, tipo Renato e Seus Blues Caps, Deno e Dino, Os Vips, Os Jovens e, claro, o grande Roberto Carlos. Fizemos uma apresentação na casa das Irmãs de Santa Terezinha. As freiras gostaram, sem antes nos pedir, baixinho, para ali não se cantar “Quero que vá tudo pro inferno”, obviamente.

Por onde andarão Dalmir, Darlan e Demontieu ?

Certo dia recebi um CD de Dalmir contando piadas. Surpresa. Guardei uma que conto para vocês:

No tempo em que as rádios usavam aparelho para realçar o eco, imitando a Rádio Globo, certo jovem foi fazer um teste para locutor, numa rádio local.
Ao começar a ler o texto, falou uma palavra esdrúxula, uma coisa que ninguém entendeu a que o eco teria dito: Como é, homem?”

Gostaria muito de encontrá-los porque tenho os três irmãos dentro de meus sonhos, esperanças e crença na natureza humana, virtudes que as mantenho desde menino-moço.

Saibam todos: esses três pobres moços do passado ficaram marcados em minhas lembranças em colorido e cinemascope. Hoje cada um desfruta do gozo de terem vencido na vida pelo trabalho.

E para quem gosta, hoje, no programa Compositores do Brasil, na Rádio Educadora, (www.radioeducadora1020.com.br), às 14 horas, o excelente Eduardo Gudin e suas músicas bem elaboradas e inteligentes.

Obrigado à Magnólia Fiuza pela foto.


Bom fim de semana.

9 comentários:

  1. Prof. Zenilton.

    Voce fala de uma epoca dourada de nossas vidas. Das lojas Astecas do nosso "Inoxidavel e gentes boa" Modesto Sisley Tavares,a unica que tinha vitrine na cidade. O primeiro sapato que comprei passei seis meses indo diariamente olhar pru bicho. Como eu queria voltar aqueles velhos tempos.

    Abraços.

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  2. Prezado Professor Zenilton.

    Os meninos Dalmir, Darlan e Demontiuex estão em Fortaleza. Aquelas dificuldades são coisas do passado. Venceram-nas pela competencia e pelo trabalho. Hoje estão todos muito bem de vida juntamente com suas familias. São meus primos pelo lado materno e grandes amigos graças a Deus. Um belo resgate de uma epoca que marcou as nossas vidas.

    Abraços.

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  3. É...

    Caríssimo conterrâneo Zé Nilton:

    Antes de mais nada, gracias pela dedicatória.

    Sabe compadre, em menos de um minuto a sua divagação me levou aqueles idos das décadas de 1960 e 1970, lá atrás no último século do segundo milênio.

    Sim conheci muito Dalmir e Demontieux com quem também convivi e fiz amizade na minha adolescencia. Não sabia que eles fossem varzealegrenses, vim a saber, ultimamente.

    A Rua Grande, depois rua do commércio, hoje rua Dr. João Pessoa, foi palco de grande movimento comercial, diga-se de passagem, ainda é!

    Os personagens citados Sr. Almir e Modesto dominavam: um, o comércio de tecidos, outro, de calçados. Toda a gente cratense se preparava para usar roupa e calçado novos na festa da padroeira em 1º de setembro. E tome queima. Essas duas lojas fervilhavam nos dias antecedentes à festa.

    Mas há um personagem que não era comerciante, contudo trabalhou no trecho bem próximo dessas grandes lojas, por cinquenta e três anos e com quem tive a honra de conviver de perto, pois com ele trabalhei quatro anos, de 1963 a 1967.

    Chamava-se José Raimundo de Oliveira, carinhosamente, Seu Zé Raimundo da Farmácia. Era a Farmácia Teles, fundada na década de 1920.

    Este homem despertou em mim, o sentimento de respeito e responsabilidade que até hoje carrego comigo. A Farmácia Teles foi meu terceiro e último emprego, dali saindo para trabalhar por conta própria.

    Abraços do

    Vicente Almeida

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  4. é o demontieux e dalmir são meus parentes grandes seres humanos pessoa de bem que ninguém consegue esquecer, e recordar o passado é uma maravilha e muitas histórias nossas dar uma bela crônica ou até mesmo contos, muito boa a história gostei muito abraços

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  5. Caros Pedrinho, Morais, Vicente e Israel, meus cumprimentos e agradecimentos por viajarem nessas histórias.
    Não sei quantos quilômentos andaram o Vicente e seus irmãos, entre subir e descer do Belmonte, para trabalhar e estudar na cidade.
    Mas entre mortos e feridos,estamos todos salvos...

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  6. Não faz muito tempo um grupo de Várzea Alegre passou um fim de semana na mansão do Demontiuex, na Praia, em Fortaleza. E eu estava lá. Ele bebia e bebia e dizia: estou zero bala!
    Foi um fim de semana muito divertido!

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  7. Zé Nilton, sempre que estamos em |Várzea Alegre é uma festa.
    Às vezes passeávamos por outros lugares: Caldas, de Barbalha; Arajara; Trussu; Orós; Lima Campos;Bravas...Fortaleza, Natal...
    Havia sempre um passeio extra, mas há uns três anos vou somente à Várzea Alegre e fico com a minha mãe, dando um apoio a quem fica com ela o ano inteiro.
    Quem sabe um dia marcamos um encontro, eu, minha galera (marido, filhos e você)?
    Um grande abraço.

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  8. Excelente, Artemisa, será um prazer tê-los em nossa companhia.

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