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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


domingo, 7 de julho de 2019

DECANTAÇÃO - Por Wilton Bezerra


Ouvindo “Chega de saudade”, com João Gilberto, me lembrei do futebol. O que uma coisa tem a ver com a outra? Vamos lá. O futebol, a religião e a música são lugares sociais do brasileiro.

Assim, nesse meu nada inspirado axioma, vejo o esporte-rei como um misto de baile, combate, celebração e...música.
Sim, e os hinos e os cânticos dos estádios? O que eu quero dizer mesmo com essa reflexão é o seguinte: João Gilberto, um dos gênios da raça, com a batida revolucionária do seu violão, produziu uma decantação da música brasileira.

Colocou, num mesmo saco, todos os gêneros musicais que imperavam no finzinho dos anos 60 – samba, samba-canção, rumba, boleros e outros mais, dentro de uma coisa moderna chamada de bossa nova. E mais: conseguiu desacelerar o samba, dando-lhe um andamento mais delicado.

Com isso, o Brasil musical ganhou o mundo. Quem manja o mínimo de música sabe disso.
Aí, eu pergunto: por que não se procura fazer o mesmo com o futebol? Sei perfeitamente que qualquer movimento de renovação terá, certamente, obstáculos criados pelos malditos dirigentes. Quero, então, me referir ao papel dos treinadores no aproveitamento do que já existe em matéria de organização de jogo.

Falo em treinadores e me lembro de imediato do tratamento dispensado a esses profissionais no futebol brasileiro. Da supervalorização, eles saem para um linchamento, se os resultados não forem bons, mesmo num curto prazo.

Mas, eles, os treinadores, tem que assumir o protagonismo no processo de mudar isso aí. A tarefa é possível, se começarem entendendo que não basta fazer jogar como antigamente.
Em cima do que fomos e de tudo que já conhecemos como esquemas táticos, os treinadores precisam fazer o mesmo que o músico baiano: uma decantação.

O futebol de troca de passes, ocupação de espaços, triangulações, deslocamentos, protagonismo coletivo, sem alijar o extraclasse, e outras novas abordagens incorporadas podem fazer resurgir o futebolista brasileiro que, certamente não desaprendeu a jogar.
Sem esse tipo de esforço o 7 X 1 continuará firme em nossa lembrança.
Quem fez uma decantação no futebol foi o treinador Guardiola. Realizou um mapeamento de todos os esquemas e estilos de jogo já inventados, decantou-os, como João Gilberto fez com a música, e produziu um híbrido.

Coisas de gênios.

2 comentários:

  1. Essa é uma daquelas postagens que não se encontra meios de comentar. Ela já diz tudo. É completa. Parabéns.

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