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"Ultrapassa-te a ti mesmo a cada dia, a cada instante. Não por vaidade, mas para corresponderes à obrigação sagrada de contribuir sempre mais e sempre melhor, para a construção do Mundo. Mais importante que escutar as palavras é adivinhar as angústias, sondar o mistério, escutar o silêncio. Feliz de quem entende que é preciso mudar muito para ser sempre o mesmo".

Dom Helder Câmara


quinta-feira, 9 de novembro de 2023

263 - Preciosidades antigas de Várzea-Alegre - Por Antônio Morais


Identificação parcial - Serginho Piau, Alberto Siebra, Dr. Rolim, Paulo Danúbio e Teresinha Costa.

Impossível ao leitor compreender, sentir ou entender sobre o carnaval atual, sem antes ter uma ideia precisa da cidade de Várzea Alegre no período que antecedeu ao primeiro desfile da Escola de Samba Unidos do Roçado de Dentro - ESURD.

A sua topografia, população, costumes, crenças e tabus precisam ser pormenorizados e comparados aos dias atuais para um melhor entendimento dos fatos a serem descritos. Essa nova geração, de posse dos recursos da informática, dos meios de comunicação de massa, da facilidade de locomoção, do acesso a livros e revistas e com o desenvolvimento de um tirocínio lógico não teriam condição de aceitar o desenvolvimento da época, sem um aprofundamento antropológico, psicológico, social e econômico deste povo. Caro leitor, entremos no túnel do tempo.

Estamos chegando ao ano, não sabemos bem, compreendido entre 1958 e 1962. O local é a rua Coronel Pimpim, conhecida por rua dos Perus. Tal nome deriva de uma família com este nome que mora nesta via pública. Um de seus membros é o delegado da cidade. Daí um contraste de Várzea Alegre: “um peru, delegado.” Tal fato foi citado em música por José Clementino, compositor local, e imortalizado nacionalmente por Luís Lua Gonzaga, o rei do baião. São pontualmente 15 horas. O estômago dá sinal de esvaziamento. Não se vê uma só lanchonete. As contrações gástricas não dão descanso. Como, que por encanto, aparece um senhor de estatura baixa, corpulento, sorriso aberto, bastante simpático, empunhando um balaio de cipó trançado. De seu interior exala um odor adocicado, que agrada as narinas dos transeuntes. É Joaquim Beato, com as suas deliciosas broas -- iguarias de formas arredondadas feita de fécula de mandioca - confeccionada rusticamente em sua padaria na mesma rua. - Que sabor delicioso. Como são crocantes estas guloseimas. Resta-nos apenas uma sobremesa. Algo doce, que nos provoque bastante sede, para podermos nos deliciar com um copo de água fresca. Não tardou muito. Eis que surge Dona Santana. O seu alfininho, alvejado pelo seu constante manuseio é tão brilhante que nos ofusca a vista e a mente. O reflexo da não saciedade é novamente estimulado e nos impulsiona para o consumo. Como estas simples gulodices nos adoça a alma. Este doce, derivado da rapadura, previamente submetida a alta temperatura, após liquefeita é resfriada e manuseada até atingir o ponto de consumo.

Após saborearmos este exótico confeito sentimos uma enorme necessidade de água. A sede chegara de forma impiedosa. Não tínhamos outra opção, senão pedir um pouco desse precioso líquido em uma dessas casas. Escolhemos uma, que se encontrava com a porta entreaberta. Batemos palmas, uma senhora veio nos atender, nos serviu água, saciou nossa sede e nos alegrou com a sua simpatia e o seu bom papo. Era a residência de Seu Zé Marcelo, nosso protético-maior. Ele, com sua paciência e seu desvelo confeccionava dentaduras, que eram comercializadas até em cidades vizinhas. Era um prático com requinte de nível superior. Tais profissionais eram bastante procurados, em razão de não existir uma política de saúde bucal satisfatória. O número de cáries dentárias era muito elevado na população geral e fatalmente esses dentes estragados teriam de ser sacrificados. Após a realização da exodontia ou extração esses pacientes, desprovidos financeiramente, fatalmente procurariam um prático para confeccionar a sua prótese dentária.

Seguindo o trajeto periferia-centro nos deparamos com a rua Duque de Caxias. Logo no início encontramos o escritório do corretor de algodão Dirceu de Carvalho Pimpim, onde tiramos um dedo de prosa sobre o novo preço do algodão. Seu Dirceu é um corretor de algodão bastante conhecido. Não somente pelo seu tirocínio e sua grande capacidade comercial, mas por ser uma figura folclórica na cidade, devido as suas inúmeras estórias jocosas. Contam que, certa vez, ele alugara um imóvel de sua propriedade e que este, estando bastante estragado, a perspicácia e o pechinchado do inquilino funcionou. - Seu Dirceu, então fica acertado este valor para o aluguel, ta bem? - Combinado, senhor! Finalizada a negociação, o inquilino, em reconhecimento, manda fazer uma reforma no prédio. Muda todo o teto, faz o serviço de retoques e de pintura. No mês seguinte, ao efetuar-lhe o pagamento, este assim o é abordado. - Vamos ter de aumentar o preço do aluguel, senhor! - Mas seu Dirceu, não foi o senhor mesmo que concordou em receber aquele valor, já que o prédio encontrava-se totalmente sucateado? - É que hoje pela manhã estive por lá e constatei que ele está bastante melhorado, portanto não dá mais pra continuar naquele preço.

Em frente ao escritório mencionado vislumbramos uma enorme casa, com extenso jardim e vários pés de fícus formando uma verdadeira cerca verde. É a casa do delegado da cidade Senhor Antônio Alves Costa, genro de Dirceu Pimpim. Homem simples, honesto, dedicado e que possuía um raciocínio fabuloso e tiradas espetaculares.



15 comentários:

  1. Prezados amigos do Blog.

    Se eu fosse escolher um titulo para este texto do Savio eu o chamaria de "Reprise da vida" ele escreve com maestria a historia de nossa cidade e nossa neste periodo de tempo que marcou as nossas vidas. Recomendo a leitura das outras tres postagens sobre esse mesmo tema. Farei no decorer da proxima semana.

    Um bom fim de semana para todos. E para mim tambem, como dizia Chica do Rato.

    A.Morais

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    1. Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk quem dera, ter eu o privilegio de tambem, ter nascido num lugar de passado täo rico.......

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  2. Morais e Zé Sávio...

    Que belo texto! Além de contar parte da história da nossa cidade, tambem citou pessoas muito próximas, como meu avô e bisavô.
    Espero que não demore as outras postagens. Já tou ansioso aqui. E com uma vontade danada de provar do "ofinin" de Dona Santana.

    Grande abraço.

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  3. Dr.Sávio, quando Piteco foi receber seu 1º aposento o caixa do banco pediu que ele conferisse o dinheiro, então ele disse precisa não, tou satisfeito só com a capa(era uma de cem).Pois bem esperemos as outras etapas apesar de está satisfeito só com a 1ª parte.Gostaria de te parabenizar, apesar de ser de uma época mais recente, recordei muito com sua narrativa. Meus parabens.

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    1. Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk.....




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  4. Zé Sávio, parabéns pelo belo texto. Retrata com rico detalhes toda a nossa história com seus caricatos personagens... Coisas mesmo só lá de nós.

    Beijos.

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  5. Flavin, Enio e Klebia.

    Uma coisa que me dava inveja era ver Dona Santana no Juremal vendendo o apetitoso alfinin aos outros garotos e eu não poder comprar o meu enroladinho por falta de grana. Foi a epoca melhor de minha vida.

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    1. Até certos fatos desfavováveis do passado, nos dão saudade atualmente.....

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  6. Dr. Sávio, uma maravilha essa viagem virtual começando pelo túneo do tempo. Morais, por favor, não demore com a continuação...
    Êita narrativa boa! Parabéns ao autor e ao escrevinhador...
    Vamos que vamos!

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  7. Amigo Morais,

    Eu já imaginava que o texto iria lhe tocar intimamente. A surpresa, pra mim, foi sensibilizar essa nova geração. Aguardemos o restante.

    Grato, pela postagem.

    Flávio,

    Eu trabalhava no comércio do meu pai, na rua Duque de Caxias, numa época que não era crime o trabalho infantil. Conheci muito bem o seu Antônio Costa e o seu Dirceu.

    Obrigado pela acesso.

    Ênio,

    Gostei da história do Piteco. Vou torcer para você ganhar os 400,00, já que o Morais dividiu o texto em quatro partes.

    Saudações.


    Klébia,

    Essa viagem pelas ruas de Várzea Alegre retrata a época do cacimbão que existia no centro da cidade. Cuidado para não descobrirem a sua idade.

    Um grande abraço.

    Glória,

    Você ler tudo mesmo, né?
    Vejo que quando chegares à Várzea Alegre poderás fazer um comparativo, e aí verás que o conteúdo deste texto já é história.
    Espero que não desembarque da nave. Boa viagem!

    Grato.

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  8. kkkkkkkkkkkkk
    Zé Sávio, não sou da época do cacimbão, é um bocadinho mais prá frente.. kkkkkkkkkkk
    Beijos grande poeta, grande médico e grande ser humano.

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  9. O bom poeta Sávio esqueceu de dizer que Dona Santana,pasava o troco com a mesma mão que puchava o pucha-puch.,

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    1. Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkklkkkkllkkk grande contribuição, para aumento da imunidade.....

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  10. O fenomenal poeta Mundim do Vale também sabe o que ela fazia para o branquinho "alfinin" não colar nas mãos. Muito bem lembrado.

    Um grande abraço.

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    1. Msis ???? Kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk Ze do Doce, la de Santana, perdia feio......
      .

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